sexta-feira, agosto 20, 2010

Justiça e estados de alma

Justiça e estados de alma


Muito mal têm estado o Procurador Geral da República (PGR) e o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP). Dos seus diferendos deram conhecimento ao país de forma inteiramente inadequada para quem exerce funções de tanta e alta responsabilidade.

Uma verdadeira peixeirada na praça pública que apenas veio confundir, ainda mais, o cidadão comum.

Embora se entenda que os diferendos existam e que ambas as partes tenham legitimidade para defender os seus pontos de vista, dificilmente se poderá perceber a linguagem e o tom.

O PGR quando afirma que o SMMP actua como um pequeno partido e um mero lobby de interesses pessoais. O SMMP quando diz que a hierarquia do Ministério Público está moribunda e que o actual PGR tem uma visão militarizada e do posso quero e mando.

São linguagens e atitudes completamente inaceitáveis. Nem o PGR deveria ter tido tecido qualquer comentário ao comunicado do SMMP nem este se deveria ter dirigido à cúpula do Ministério Público daquela forma.

A liberdade é, talvez, o pilar mais importante da democracia e que inclui o direito de associação sindical. Mas tudo isso não pode justificar que se ponha em causa o próprio estado de direito. Mas foi isso que, infelizmente aconteceu.

O PGR (legitimamente nomeado) e o SMMP (livremente constituído) deveriam ter sabido açaimar dos seus estados de alma e não pôr em causa, de forma tão óbvia e crua, relações institucionais respeitosas e respeitadoras que deveriam existir em órgãos de soberania.

Veio tudo isto a propósito do tão badalado caso do Freeport de que toda a gente fala mas que muitos poucos conhecem com fundamento. À boa maneira portuguesa todos mandam bocas e tomam partido consoante simpatias pessoais/partidárias sem grandes preocupações pelo rigor nem pelo bom nome das pessoas.

A novela PGR/SMMP em nada veio ajudar a esclarecer o que quer que fosse mas somente abalar, ainda mais, o fraco conceito em que os portugueses têm a sua justiça. Mesmo sem ser jurista se percebe que algo anda mal no reino da Dinamarca.

Como explicar então que perguntas, eventualmente, a dirigir ao Primeiro Ministro não tenham sido feitas atempo e horas e se tempo não tivesse havido não se tivesse pedido uma prorrogação de prazo? E que não tendo sido feitas venham a fazer parte de um despacho?!

Situação que cheira a falta de lealdade que deveria existir de cima para baixo e, certamente, de baixo para cima. Dando, possivelmente, razão a um ilustre jurista que se não acanha de falar em pandemia de deslealdades. Um conceito que, infelizmente, parece ter sério fundamento.

A Justiça, para o ser, tem que ser rápida, competente e eficaz. Se assim não for de pouco servirá, a quem quer que seja. E para o ser terá que se fazer num contexto de respeito institucional que não se compadece com brigas na via pública.

Muito pior andarão os caminhos da justiça em Portugal se quem de direito não exigir mais. Porque é de exigir que o PGR e o SMMP colaborem a bem da justiça, e trabalhem paralelamente sem se atrapalharem. Objectivo maior num verdadeiro estado de direito.


PEDRO DAMASCENO