sexta-feira, outubro 29, 2010

O orçamento de estado

O orçamento de Estado

Quando se presume que está eminente o epílogo da novela do orçamento do Estado 2011 fica-nos a sensação disso mesmo: de que vivemos mais uma novela recheado de sensacionalismo tendo faltado apenas um pouco de sexo.

Passando o orçamento ou não (e provavelmente vai passar) fica para trás uma maratona de negociações que não eram para ter acontecido mas que aconteceram, num clima de crispação incompreensível.

Semelhante ao que aconteceria se tivessemos a nossa própria casa a arder e nos virássemos unas aos outros em vez de tentar apagar o fogo, o mais rapidamente possível.

A hora de todos os julgamentos políticos e partidários virá a seu tempo e, sem dúvida, que haverá vencedores e vencidos. Mas sobre os escombros resultantes de um incêndio por fogo posto.

O momento difícil que vive Portugal não é apenas , nem essencialmente, devido à crise internacional e/ou à gestão politica do país. Esses são apenas alguns dos ingredientes de uma situação bem mais profunda e complexa.

Diz-se, e é verdade, que temos os políticos que merecemos. Estes são, ao fim e ao cabo, entes de carne e osso como todos nós e reflectem de forma relativamente fidedigna quem os elegeu.

Desde o 25 de Abril que, infelizmente, se vulgarizou a consolidação do conceito de clientelas partidarias como forma priveligiada de chegar ao poder e o manter. Por isso são responsáveis os partidos (nomeadamente os do arco do poder) e todos nós.

E também se assumiu que, por hipotético truque de mágica, passamos de um paíz atrasado, deprimido e cinzentamente conservador para um país europeu e moderno com indíceis que desenvolvimento que nos conferiram acesso ao consumo destravado.


Passamos dos oito para os oitenta, sem pontos ou vírgulas.

O campo desertificou-se ainda mais, extensas áreas do litoral foram selvaticamente destruídas e ocupadas por betão e o mar foi esquecido. O crédito fácil e abundante subverteu a prudência e a vontade de trabalhar.

Passamos, no ranking mundial da corrupção, do 23º lugar para o 35º. Um evolução negativa só explicável à luz da impunidade de que a corrupção goza em Portugal. Ao ponto de se ter tornado quase um status socialmente aceitável e uma inevitabilidade.

O chico-espertismo e o desenrascanço tornaram-se duas marcas de sucesso, imprescindíveis à boa progressão social e financeira. A administração pública tornou-se num polvo incontrolado e incontrolável.

Os três pilares da democracia – saúde, educação e justiça – tornaram-se piores, mais caros e mais escassos. Consequência directa do facto de que a riqueza produzida pelo país ser, sistemáticamente, ultrapassada pelos gastos do Estado.

O nosso grande problema não é a viabilização ou não do orçamento de 2011. Essa é uma mera questão de curto prazo e conjuntural. O nosso grande problema é não termos interiorizado ainda que temos todos que mudar: muito e depressa.

Da esquerda à direita, do rico ao pobre, do empresário ao assalariado, do político ao eleitor, do funcionário público ao trabalhador da privada. E todos temos uma boa ideia sobre o que precisamos de mudar.

Mas persistimos em manter a cabeça debaixo da areia, á espera do malfadado D. Sebastião, de mítica memória e trágica realidade.



PEDRO DAMASCENO

terça-feira, outubro 26, 2010

Alugar um gato!

Alugar um gato!


O Japão, país de tradições comunitárias e com uma das maiores taxas de centenários do mundo, não consegue assegurar uma velhice condigna para um grande número dos seus cidadãos.

Um país que, num passado recente, tinha dois pilares fundamentais – a comunidade e a família – entra numa rampa descendente no que diz respeito aos apoios aos idosos.

A criminalidade grisalha, como lhe chamam, atinge proporções preocupantes sobretudo em grandes meios urbanos como Tóquio. Os lares para idosos são ainda raros e a rua é, muitas vezes, a única opção.

Afinal são mais de 8 milhões de cidadãos com mais de 80 anos e 29,4 milhões com mais de 65 anos. Num país com uma população de de 127 milhões. Fenómeno que está acontecer, um pouco, por todo o mundo “desenvolvido”.

O país da alta tecnologia resvala para um estilo de vida implacável em que horários de trabalho de 12 horas por dia são correntes deixando os cidadãos privados de um verdadeira vida pessoal.

Vidas em que não é possível cultivar amizades e criar laços comunitários/familiares. Surgindo, desse modo, novos negócios que se dedicam a alugar o que as pessoas não conseguem ter: desde “um bom amigo” até um gato para passearem no pouco tempo que lhes resta!

E o aluguer de um gato pode atingir valores da ordem dos 8 €/hora!

Embora falando de situações limites de grandes cidades não deixam de ser indicadores altamente preocupantes do que acontece quando as sociedades se desumanizam e não deixam lugar condigno para aqueles atingiram o limiar das suas vidas.

Sendo os Açores ainda essencialmente rurais já se notam sinais claros de degradação dos valores comunitários e familiares e uma insensibilidade crescente para com os idosos nomeadamente para os mais dependentes.

O número de idosos que procuram instituições de solidariedade social para terminarem os seus dias tem vindo a crescer e os laços comunitários e familiares têm vindo a afrouxar.

Ainda bem que tem havido investimento público muito significativo nessa solução que não sendo a ideal dá resposta a pessoas que já não conseguem encontrar suporte no seio das comunidades e famílias.

O ideal seria que os idosos não fossem “obrigados” a deixar as suas casas e as comunidades e mantivessem um contacto diário com os vários grupos etários. Sendo sabido que as instituições de idosos acabam sempre por provocar a sua exclusão social por muito boas que sejam as condições de alojamento.

O frenesim e as exigências consumistas da vida moderna geram nos mais novos uma impaciência para com os “velhos” que, ao invés de serem fontes de conhecimento e experiência, se tornam empecilhos. E, assim, se quebram inestimáveis cadeias de solidariedade e entreajuda.

Os avós precisam dos filhos e dos netos. Mas nada mais do que os netos e os filhos precisam dos avós e pais. Como acontecia no advento do homem e como ainda acontece em comunidades rurais em muitos pontos do globo.

Sendo conhecida a veneração pelos idosos que as civilizações ditas mais primitivas cultivavam (e muitas ainda cultivam) torna-se incompreensível a crescente impaciência que a nossa cultura do fast food e de tudo o resto adopta em relação a eles.

No fundo, com um pouco de sorte, todos nós seremos idosos amanhã e bom seria que não víssemos obrigado a alugar um gato ou a contratar um “bom amigo”.

O amanhã começa hoje.


PEDRO DAMASCENO

sexta-feira, outubro 08, 2010

Finalmente - Aeroporto do Pico?

Finalmente – Aeroporto do Pico!?


O encerramento para obras, previsto para breve, da pista de São Jorge vai implicar a deslocação para o Pico do tráfego daquela ilha. O que implicará que o aeroporto do Pico passe a servir cerca de vinte cinco mil pessoas.

Situação que obviamente irá colocar novos desafios ao tráfego aéreo de/e para o Pico. Embora a informação oficial da duração das obras aponte para período muito curto estas estarão sempre condicionadas a factores exógenos entre os quais avultam as condições climatéricas.

Desafios que a estrutura aeroportuária desta ilha está em perfeitas condições de satisfazer, salvo o malfadado abastecimento das aeronaves – processo com contornos e atrasos incompreensíveis para o comum dos mortais.

Sendo sabido que o investimento até agora realizado no Pico não tem tido remuneração em termos de prestação de serviços, quer no que diz respeito ao seu papel de gateway quer no que diz respeito à sua proximidade de São Jorge e ao papel de complementaridade que deveria ter em relação ao aeroporto da Horta.

Em contradição com as convicções de um ex-alto responsável da SATA que previa para o Pico um protagonismo decisivo para as ligações do Triângulo com o exterior e dentro Açores dada a sua centralidade e o seu carácter de alternativa a Castelo Branco.

Tendo-se criado , somente, o voo de má figura dos sábados para se dar, apenas, cumprimento à promessa da criação da gateway do Pico, voo que não interessa nem ao Menino Jesus e que, serve simultaneamente, de farisaica fundamentação para a absurda afirmação de que esta ilha não tem mais voos porque tem oferta e não tem procura!

A Ilha do Pico não tem oferta de voos para o/e do exterior. Tem apenas um faz de conta que não serve a ninguém: nem turistas nem locais. Toda agente sabe isso.

Passando a servir, agora, mais dez mil pessoas estima-se estarem reunidas as condições para se iniciar uma nova era da sua gateway com a concretização de, pelo menos, dois voos semanais (segunda e sextas) o que para além de vir satisfazer anseios legítimos se afigura como uma medida comercial de elementar bom senso.

Longe vão os tempos em que as reivindicações de carácter meramente bairrista faziam sentido. Hoje tem que se apostar, cada vez mais, na boa gestão dos recursos e numa análise dos números, actualizada e correcta.

A importância crescente da Ilha do Pico no contexto regional é bem visível a olho nú e só não vê quem não quer. Seja nos sectores primários e da transformação seja no estratégico sector do turismo, a afirmação desta ilha é inegável e imparável.

Insistir em manter o Aeroporto da Horta como a única getway, objectiva e real, das ilhas do Triângulo é, antes de tudo, um clamoroso erro de análise e de gestão. Quer por parte das companhias aéreas quer por parte dos responsáveis pelo sector dos transportes.

Erro que, alias, contradiz completamente o investimento muito vultuoso que foi feito no Pico. Das duas uma: ou se fez um investimento impensado e sem fundamento ou então estão a subordinar-se os interesses de um boa gestão dos recursos e de uma visão estratégica de desenvolvimento a inexplicáveis razões que a razão desconhece.

Por muito curto que seja o encerramento de São Jorge bem pode esperar-se que estes mais dez mil utentes do Aeroporto do Pico sejam o talismã e a oportunidade para teste e mudança. Que servirá a todos, quer no plano pessoal quer no plano da economia, pura e dura.

Já não é sem tempo!



PEDRO DAMASCENO