sexta-feira, agosto 19, 2005

Será que ainda amamos, de verdade, a nossa Ilha?

Será que ainda amamos, de verdade, a nossa Ilha?



Desde sempre, os nossos agricultores tiveram um papel central na manutenção do ordenamento territorial das ilhas. Foram eles que modelaram, com suor e lágrimas, o que é hoje património da humanidade.

Foram eles que, com sensibilidade e bom senso, conquistaram, pedra a pedra, a terra que lhes permitiu sobreviver e criar as suas famílias. Terra com que estabeleceram uma relação reverencial.

Porque eles percebiam e sentiam que sómente uma relação de muita proximidade e respeito com a terra, lhes poderia assegurar sustentabilidade e, o mesmo é dizer, a sobrevivência.

Eram tempos muito duros em que as ligações com o exterior eram precárias e raras. Tinham, forçosamente, que depender da mãe-terra para tudo. Sentiam estas terras como a sua verdadeira casa, como o ventre da sua mãe.

Quem não se lembra, ainda, de velhos agricultores e do seu apego e verdadeiro amor à terra? Para eles, a terra era muito mais que um meio de sobrevivência – era um modo de vida, uma maneira muito especial de estar na vida.

Vida muito modesta mas temperada por uma dureza que lhe conferia um elevado grau de humanidade e de capacidade de entreajuda. Vida que, no entanto e felizmente, melhorou, a olhos vistos, nas últimas décadas.

E dá gosto ver a substancial elevação do nível de vida dos agricultores, desde a qualidade da habitação, ao poder de compra e à própria escolaridade. Bem longe vão os tempos de profunda modéstia em que viveram durante séculos.

Por tudo isto seria de esperar – pensamos nós – um maior cuidado e sensibilidade pela natureza e pelo ambiente que serão sempre, ao fim e ao cabo, o suporte da actividade agrícola.

Sendo, por conseguinte, com a maior mágoa que começamos a verificar, por toda a ilha, um total desleixo no tratamento do lixo resultante das explorações agrícolas nomeadamente dos sacos utilizados para as rações e fertilizantes, dos invólucros de medicamentos, das coberturas plásticas e, mesmo, de grades de madeira para transporte de carga.

As nossas terras começam a estar invadidas por todos esses detritos que condicionam, de forma crescente, a paisagem e dão uma péssima imagem de nós próprios. E já não é raro ver turistas a recolher esses detritos que, posteriormente, depositam em local apropriado!

Para além das questões de mera higiene e de asseio fica-nos a sensação que há, por trás de tudo isso, um falta de respeito e, mesmo, de amor por essas terras que já deram de comer a tantas gerações e que, ainda hoje, são o primeiro suporte destas ilhas.

Seja por causa da actividade pecuária, seja por causa do turismo ou seja – simplesmente – por causa da nossa qualidade de vida. Sendo que um dos pilares básicos de qualquer actividade sustentável é o total respeito pelos recursos existentes.

Ou – por outras palavras – um crescimento sustentável só é possível se salvaguardarmos os nossos recursos de modo a que os vindouros também os possam vir a usufruir. O que não será, concerteza, o caso de uma paisagem infinda de sacos de rações e recipientes plásticos.

Será que ainda amamos, de verdade, a nossa Ilha?



P E D R O D A M A S C E N O







sábado, agosto 13, 2005

A importancia do estado laico


O Estado deve preservar uma distância primordial em relação à esfera religiosa
Vital Moreira


A importância do estado laico



Desde há muito que se entende - na Europa - que a secularização do Estado é um sinal de modernidade e tolerância. A nossa história provou que o casamento entre Estado e Igreja nunca foi benéfico nem potenciador de desenvolvimento.

Progressivamente, foi ganhando raízes o entendimento de que as opções religiosas são questões da esfera íntima e pessoal e que, por isso mesmo, não se devem repercutir na sociedade como um todo. Tanto mais que a mescla de religiões que existem no nosso seio tem vindo a crescer de forma significativa.

Há muito tempo que a maioria dos estados europeus deixou de precisar da religião para afirmar a sua identidade nacional. Para que alguém se sinta português, hoje em dia, não é forçoso que se sinta católico, embora o Catolicismo tenha sido a religião que mais profundamente marcou a História e a Cultura portuguesa.

O que de modo algum retira às práticas religiosas a importância que podem ter no âmbito pessoal e espiritual. Mas que, apenas, coloca no plano certo uma faceta – embora muito importante – da nossa vida.

Qualquer confissão religiosa tem como base uma posição de fé. Fé que não carece de demonstração para poder ser vivida em plenitude e que, simultaneamente, deixa de fora qualquer necessidade de debate.

Uma religião necessita de estudo, aprofundamento e militância. Mas jamais necessitará do voto democrático como forma de poder exercer a sua actividade. Por definição, só pratica uma religião quem quer.

A opção religiosa é, antes de mais, uma escolha do coração e do espírito.

Após um período relativamente longo (sobretudo no Ocidente) de “adormecimento” religioso, verifica-se, presentemente, um recrudescimento sensível da actividade religiosa e espiritual.

Das grandes manifestações religiosas do pontificado de João Paulo II aos fenómenos de radicalismo islâmico, passando pelos movimentos evangélicos americanos e africanos, sem esquecer o crescimento de práticas espirituais relacionadas com o budismo e o taoismo.

E são, precisamente, as correntes mais radicais que pretendem impor a dessecularização do Estado como consequência da dessecularização da sociedade. Como se a perda de laicismo do Estado fosse condição necessária, ou mesmo imprescindível, para a prática religiosa.

Sendo certo, isso sim, que a mistura entre religião e Estado tem levado a conflitos e guerras como, abundantemente, provam os casos dos Balcãs e o conflito da Irlanda do Norte, ou, pelo menos, criado interferências dramáticas, como no caso do Iraque e do Médio Oriente.

Ou gera novos fenómenos, como é o caso mais mediático da actualidade: o terrorismo de cariz fundamentalista islâmico. Aí, é a própria religião que se pressupunha dever procurar a concórdia e a harmonia que vem, ela própria, espalhar o terror e o ódio!

Por muito contraditório que possa parecer, é o Estado laico quem melhor defende toda e qualquer religião. Só ele poderá garantir que os direitos – cada vez mais actuais – da liberdade, igualdade e da fraternidade sejam respeitados e que, por via disso, se possam desenvolver as mais diversas opções religiosas e espirituais.




P E D R O D A M A S C E N O