sexta-feira, dezembro 04, 2009

Os minaretes da Suíça

Os minaretes da Suíça


Os minaretes são torres que existem, habitualmente, nas mesquitas e que se destinam a fazer os cincos chamamentos diários para as orações muçulmanas e que, tradicionalmente, são feitos pelos almuadem.

Os almuadem são os encarregados de fazer esse chamamento que é feito em forma de um cantar monocórdico com alusões a Ala e a Maomé. Prática que faz parte, também, do exotismo de muitos países árabes sobretudo ao anoitecer.

As orações são feitas no interior das mesquitas e em nada dependem directamente dos chamamentos feitos dos minaretes pelo que a sua existência, ou não, em nada coarcta a livre prática religiosa, um indiscutível pilar da democracia.

Na Suíça os muçulmanos representam cerca de 5% da população e, para alem de três mesquitas com minaretes, tem uma vasta rede de mesquitas e locais de oração que asseguram a sua prática religiosa.

Os três minaretes existentes na Suíça deixaram há muito de ser utilizados para os chamamentos das orações constituindo apenas um pormenor arquitectónico das mesquitas não tendo qualquer utilidade prática.

Desconhece-se, em absoluto, limitações à prática religiosa na Suíça. Seja da religião muçulmana ou qualquer outra. Sendo no entanto bem conhecida a intolerância religiosa nos países em que o islamismo controla a política.

No referendo efectuado naquele país apenas se decidiu a autorização ou não da construção de minaretes e nunca qualquer restrição à livre pratica religiosa. Somente se decidiu se os minaretes também podem fazer parte da paisagem suíça.

Sendo a Suíça um país soberano e que preza muito, e com toda a legitimidade, a sua identidade cultural e paisagística tem todo direito democrático de decidir sobre uma matéria que só foi notícia porque não é, actualmente, politicamente correcto ser considerado intolerante religioso.


Sendo a região islâmica aquela em que o fenómeno do fundamentalismo é mais evidente não deixa de ser irónico que a mera construção de um pormenor arquitectónico que, ainda por cima, é tipicamente árabe num país europeu seja notícia de intolerância religiosa!

Tanto quanto se sabe os muçulmanos são inteiramente livres de praticar a sua religião na Suíça ou em qualquer país europeu. Podendo para o efeito construir, alugar ou pedir emprestados os seus locais de culto. Não tendo a questão dos minaretes nada a ver com o caso.

Os suíços entenderam que não queriam a sua paisagem típica e, simultaneamente, marca turística descaracterizada por torres que nada têm a ver com ela. Estão no seu pleno direito.

O resto é conversa de quem ainda não percebeu que sendo a liberdade sendo um bem precioso não pode, jamais, servir de pretexto para dar cobertura democrática a quem não a pratica.

Liberdade sim, mas para tudo. Mesmo para dizer que não.


PEDRO DAMASCENO

sexta-feira, novembro 06, 2009

Quando o ilógico se torna rotina

Quando o ilógico se torna rotina



Totalmente remodelado o aeroporto do Pico, percebidos os desafios das acessibilidades e as especificidades das três ilhas do triângulo tudo parecia encaminhar-se para a coordenação e a complementaridades dos transportes.

Mas nada mais longe da realidade.

Tudo continua a acontecer como se as três ilhas pouco ou nada tenham a ver umas como as outras, como se o aeroporto do Pico seja um mero fait-divers não um investimento com objectivos claros e como se a Transmaçor fosse uma libelinha tonta.

Não há coordenação, complementaridade ou simplesmente lógica. Os voos da TAP para a Horta continuam a ter horários como se apenas servissem a Ilha do Faial, a Transmaçor continua a não perceber que aqueles voos trazem, invariavelmente, passageiros para o Pico e este continua a ter uma ridícula desobriga semanal da TAP.

E não adianta pregar ou barafustar. Continuam todos de costas olimpicamente voltadas continuando a ser possível ver o Cruzeiro do Canal ainda dentro do porto da Horta depois de um rally iniciado no aeroporto de Castelo Branco ou a ter dias em que não há voos nem para o Pico nem para o Faial.

A descoordenação é tão chocante que parece ser propositada. Recursos que se desperdiçam, tempos de pessoas que se desprezam e oportunidades que se perdem.

Situação que assume contornos surrealistas quando experimentada por quem nos visita e desconhece as nossas idiossincrasias de antanho. Pessoas que ficam sem vontade de voltar, sobretudo em época baixa.

Parece ter sido tudo planeado ao milímetro para não funcionar.


Sendo a única pedrada neste nosso charco, as viagens diárias e todo ano para São Jorge de parto bem difícil mas que irão, certamente, consolidar o triângulo e tornar os jorgenses nossos efectivos parceiros.

Quando a lógica e o bom senso apontam para a necessidade absoluta de evitar desperdícios e maximizar recursos parece não ser possível coordenar Transmaçor, SATA e TAP criando condições de diálogo e cooperação.

O que falta?

Falta, com toda a certeza, a percepção e a interiorização do conceito de triângulo e de proximidade que existe neste mini-arquipélago, tão próximo e tão distante. Como falta o exercício de uma cidadania do triângulo em detrimento dos bairrismos de ilha ou de concelho.

Algumas apostas estão lançadas embora as nuvens permaneçam. Resta agora saber concretizar no terreno uma lógica de união e de procura de sinergias que venham tornar esta zona do Arquipélago num ainda mais apetecível lugar para se viver e num empolgante destino turístico.

E que, sobretudo, torne o lógico em rotina.



P E D R O D A M A S C E N O

sexta-feira, outubro 16, 2009

Eu, também, sou negro

Eu, também, sou negro.


A polémica gerada em torno da atribuição do Premio Nobel da Paz a Barack Obama possibilitou uma análise, mais profunda dos fundamentos para a atribuição do galardão.

Com gente a favor e gente contra, mas centrando o debate essencialmente nos méritos ou deméritos do presidente americano para o receber. Esquecendo que a Academia Sueca também o tem atribuído para sublinhar causas,

Foi assim no Médio Oriente (Sadat e Begin), em Timor (Ramos Horta e Ximenes Belo) e foi também por uma causa que foi atribuído a Al Gore. Foi assim quando foi atribuído a instituições como as Nações Unidas ou a Agencia Internacional da Energia Atómica.

A Barack Obama foi atribuído por pelos seus esforços para reforçar o papel da diplomacia internacional e a cooperação entre os povos e tem o objectivo evidente de apoiar a paz e a concórdia.

Sendo os Estados Unidos, ainda, a maior potência militar do globo está-lhe reservado um papel central na procura e consolidação da paz. Tendo Obama sucedido ao militarista Bush ficou claro que os americanos depositaram, também, naquele um grande capital de esperança,

A eleição de Obama representou para os Estado Unidos uma verdadeira revolução: negro, democrata, verde e pacifista. Tudo aquilo que Bush não era e que nos deixou um travo amargo de mediocridade, arrogância e militarismo.

Ser negro é uma forma de vida tão válida e necessária como qualquer outra. Mas eleger, em 2008, um negro para a Presidência dos Estado Unidos representou um salto gigante a favor das causas da igualdade e da paz.

Barack Obama ao conseguir fazer eleger-se e dispor-se a correr um constante risco de vida num país com tradição de assassinar presidentes, tornou-se num dos meus heróis.

Sendo apenas um homem tem, fatalmente, defeitos e virtudes como todos nós. Mas é um homem de coragem e resiliência fora do comum. Um homem que representa um marco na história recente da América.

Penso ser lícito pensar que o Nobel foi atribuído mais àquilo que Obama representa do que a ele próprio. Ou melhor, é impossível dissociar a pessoa das causas que defende e do trabalho que tem pela frente.

A atribuição do prémio representa, por isso, um forte sinal de reconhecimento por parte de um país europeu da necessidade da cooperação transatlântica e um grande incentivo para as colossais tarefas da paz e da justiça.

E Obama vai precisar de todo o apoio que consiga reunir.

A sua eleição foi apenas um primeiro passo para a grande caminhada que visa mudar o paradigma das relações entre as nações e o equilíbrio entre pobres ricos e entre norte e sul.

Por tudo isso eu, também, sou um negro. Com o mesmo espírito que Kennedy afirmou ser um berlinense em 1963 junto ao muro de má memória. Bem haja Real Academia Sueca dos Prémios Nobel!


PEDRO DAMASCENO

sexta-feira, setembro 18, 2009

"Fuck them"

Fuck them
Alberto João Jardim dirigindo-se a jornalistas


“Fuck them”


Qualquer pessoa que perceba, minimamente bem, inglês sabe que o título desta crónica é do mais ordinário que se pode dizer na língua de William Shakespeare. Embora comum hoje em dia, mas muito ordinário em qualquer dos casos.

Então porque o escolhi?

Porque foi essa a expressão que o Presidente do Governo Regional da Madeira entendeu adequada para mimosear os jornalistas que indagaram das razões porque Manuela Ferreira Leite usou automóveis do Governo Regional na sua visita partidária à Madeira.

Expressão que dita publicamente (tendo sido transmitida pela TV) se enquadrava, até 1983, num crime público. Tendo sido despenalizada não deixa, por isso, de ser totalmente ofensiva e inadequada ainda agora.

E perante tudo isto, mais uma vez, nada aconteceu!

O Presidente da República a banhos em Boliqueime. E o resto do pessoal a encolher os ombros e a acomodar-se, novamente, aos destemperos (de que origem?) daquele que se apresenta como o bobo de serviço na Corte da Madeira.

Penso que nem Benito Mussolini, pese embora a sua forte veia de palhaço, foi tão longe.

É difícil perceber como um país que se indigna tão violentamente com a suspensão do noticiário da Senhora Manuela Moura Guedes não reaja ao facto de um Presidente de Governo Regional mandar “foder”, em alto e bom som e com todas as letras, os jornalistas!

E não consta que o respectivo Sindicato tenha decidido tomar alguma atitude e, muito menos, que a AACS (Alta Autoridade para a Comunicação Social) tenha tomado posição sobre o assunto.

Embora seja público e notório, desde há muito tempo, que o Dr. Alberto João Jardim deixou de ter condições para exercer um cargo de tal importância.

Não só pela mais elementar falta de boa educação e respeito pelos outros como, sobretudo, pelo desrespeito provocatório, trauliteiro e sistemático dos órgãos de soberania nacional num exemplo flagrante de ausência de sentido de estado e de cultura politica e democrática.

Só não vê quem não quer ver. O eterno argumento de que arrecada sempre o voto popular é, no mínimo, patético. Como se toda a gente não soubesse como estas coisas se fazem com o beneplácito de um regime democrático frouxo.

O que torna o regime da Madeira num exemplo paradigmático das perversões da democracia quando ela é entendida como um simples ir a votos. E, o mesmo é dizer, da ileteracia e do caciquismo que ainda se vive em Portugal. Pragas de que não nos livraremos enquanto houver, no activo, semelhantes políticos.

Mas tudo isto é bater em ferro frio porque, há muito, que a democracia portuguesa se afunda num conformismo exasperante e num aparente complexo do exercício da autoridade com a óbvia falência do normal funcional das suas instituições.

Mas lá que irrita e machuca, é verdade.


PEDRO DAMASCENO

sexta-feira, setembro 04, 2009

A insustentável leveza da nossa democracia

nunca ninguém nos presta contas de coisa alguma
Ricardo Costa




A insustentável leveza da nossa democracia



Aproximam-se novos actos eleitorais e aí está a parafrenalia promocional. Cartazes, cores, frases e - mais tarde - tea-shirts, esferográficas, bonés e mais cartazes e frases. E muita barulheira.

Chegou o zénite da nossa democracia: as campanhas eleitorais. As máquinas partidárias aquecem os motores e os militantes acordam depois de uma longa hibernação. Os escritórios desertos animam-se de novo.

Os programas e folhetos que praticamente ninguém lerá (porque não vale a pena?) saem para a rua. Provavelmente a sua aplicação nunca será monitorizada, de forma transparente e sistemática, fado a que já nos habituámos ao longo dos mais de 30 anos da nossa democracia.

Fica tudo mesmo assim.

Os partidos políticos empenham-se, nova e encarniçadamente, na luta pelo poder. O que, na prática, acaba por ser o seu grande objectivo pesem as listagens de soluções, mais ou menos milagrosas, que sempre propõem para salvar o país.

Não questionando as boas intenções - que dessas está o inferno cheio – fica a ideia de que os programas são uma chatisse. E que servem sobretudo para serem argumentos em sede de debates que, mesmo assim, quase sempre descambam para diatribes pessoais.

A grande maioria dos leitores submerge perante a avalanche inusitada de informação e de interesse pelas suas anónimas pessoas que, na véspera, não constavam do mapa e agora recebem resmas de apertos de mãos e de pancadas nas costas.

Vindos de um grande vazio de militância partidária e ideológica e de activismo cívico os eleitores são, de repente, o centro de todas as atenções. Uns mordem a isca mas um grande número desconfia e fica em casa. Uma minoria mais politizada vai tentando fazer navegação à vista e votar útil

Crescentemente.

Longe vão os tempos do debate político convicto e participado. E assim vai a insustentável leveza desta nossa democracia que persiste em tornar a política num circo feérico e mediático em que a imagem vale quase tudo e a substância quase nada.

A abstenção dispara e o interesse cai a pique. O recrutamento dos políticos entra numa crise semelhante ao recrutamento de sacerdotes. Quem não pode caçar com cão caça com gato e portanto que venha a nós quem quer e não quem é preciso.

É necessário lutar pela democracia porque não há alternativa. É necessário defender os partidos porque sem eles não há democracia. Mas ainda bem que há vida para além deles e dos períodos eleitorais e talvez seja essa mesma a chave para o futuro.


PEDRO DAMASCENO

sexta-feira, agosto 21, 2009

A dança dos transportes

A dança dos transportes



Um arquipélago de nove ilhas, com pretensões a ser destino turístico, como os Açores tem que ter uma política que assegure transportes eficientes, fiáveis e de custo aceitável.

A nossa condição a isso obriga.

Contudo as complicações, desencontros, insuficiências e preços dos nossos transportes não auguram nada de bom. Viajar de avião entre as ilhas continua a ser proibitivamente caro e de barco uma aventura.

Verdade para toda a Região mas, ainda mais verdade, para as ilhas do Triângulo e Flores. Por aqui o aeroporto do Pico jaz morto e apodrece e as ligações marítimas com São Jorge são o que são.

Restando a esperança que as reiteradas promessas políticas de ligações diárias e todo ano com a Ilha do Dragão tenham, já este ano, concretização. E que, finalmente, a novela do abastecimento de combustível às aeronaves no aeroporto do Pico termine.

Esperando-se, também, que os cancelamentos do aeroporto da Horta não continuem a significar aterragens na Terceira e regresso a Lisboa transformando uma viagem de duas horas e meia em sete horas e meia. Assim não há turismo que resista.

Como se espera que o horários publicados pela Transmaçor na Internet correspondam aos horários efectivamente praticados. Ninguém acredita que essa discrepância possa existir mas a verdade é que existe e muito boa gente perdeu ligações por isso mesmo!

Passados dois anos sobre a inauguração do aeroporto e da realização de investimento de 25 milhões de euros, o Pico continua a ser tudo menos um aeroporto alternativo ao da Horta e, ainda menos, uma gateway da Região. Cheirando o voo semanal a mera desobriga política.

Do outro lado do Canal de Vitorino Nemésio estão cerca de 10.000 pessoas inquietas para verem a sua Ilha ligada, de forma consistente e eficaz, ao Pico e ao Faial e por terem acesso rápido a uma gateway que lhe permita entrar e sair da Região com a fluidez que as limitações do seu aeroporto não permitem.

Não podemos continuar sujeitos ao livre arbítrio da SATA Internacional e da TAP pesem embora as boas intenções do regulamento de serviço público. Terá que existir um conjunto de procedimentos estandardizados para os cancelamentos. Os pilotos não podem ter a última palavra.

É sabido que a palavra de boca é a melhor forma de promoção mas experiências quase surrealistas que continuam a acontecer, quer de avião quer de barco, não auguram nada de bom. Já basta o nosso destino ser caro.

O desafio está, sem dúvida, dos lado dos políticos que não podem continuar esconder-se por trás da teoria que o mercado é que funciona mas está também do lado dos empresários e respectivas associações.

O dossier dos transportes é muito complexo não se compadecendo com visões e reivindicações simplistas e, muito menos, com medidas avulsas. É indispensável pegar nele com uma atitude fresca e isenta de preconceitos num ambiente de diálogo e concertação.

Ou então continuaremos a ser somente um potencial destino turístico e um negócio de apenas dois meses por ano.


PEDRO DAMASCENO

sexta-feira, agosto 07, 2009

O POLVO

O POLVO

Sem dúvida que existem excepções na Administração Pública: pessoas competentes, empenhadas e diligentes. Mas não passam disso mesmo, excepções.

O resto é uma máquina pesada, ineficiente e caríssima que asfixia este país.

Atingindo todos os sectores mesmo os mais nevrálgicos como a Saúde, a Educação e a Justiça. E não há estado de direito que resista, por muito perfeita que sejam a Constituição e as leis.

Tendo os agentes dessa administração a noção, correcta alias, que os seus votos são um peso decisivo no “jogo” democrático e que, por conseguinte, não há partido, com ambições de poder, que se “atreva” a desafiá-los.

E assim tem sido desde o 25 de Abril. O que leva a que saudosos do salazarismo e outros-que-melhor-não-entendem façam apelos ao regresso ao passado.

Confundindo tudo. Porque o que este país precisa não é de uma versão reciclada do dinossauro excelentíssimo mas sim de uma autoridade democrática que cumpra e faça cumprir as leis.

Uma autoridade constituída com base no voto e no sufrágio popular mas que se decida a servir e não a servir-se. Que saiba usar, sem tibiezas ou complexos, a autoridade que lhe foi conferida para defender os cidadãos e os seus direitos.

Sobretudo num país em que a ileteracia ainda tem um peso muitíssimo significativo e aonde as tradições democráticas são muito recentes e que, por isso mesmo, precisam de ser consolidadas pelo exemplo que tem que vir precisamente da classe política e dos agentes da administração.

Muito se escrito sobre isto, muito tem se tem barafustado mas sem resultados à vista. A abstenção aumenta sistematicamente e os exemplos que por ai abundam em nada ajudam.

Veja-se o último caso bem ilustrativo da javardisse a que chegou a política portuguesa. Um politico é condenado em tribunal a prisão efectiva e a perda de mandato e tudo o que se lembra é de começar, nesse momento, a sua campanha para as próximas eleições!

Tudo isto não é normal e atesta, eloquentemente, a degradação a que chegou a cidadania em Portugal. Uns fingem que não estão a ver, outros que não percebem e o povinho, esse “coitado”, fica de boca aberta a indagar-se sobre para que servem os tribunais e a justiça.

A nossa democracia bem precisa de uma lufada de ar fresco, que terá de vir de um número crescente de pessoas que, individualmente ou organizadas, passem a exercer uma cidadania esclarecida, interventora e fortemente reivindicativa.

Assim não sendo o polvo não parará de crescer.



P E D R O D A M A S C E N O

sexta-feira, julho 24, 2009

São rosas, meu Senhor!

São rosas, meu Senhor!



Faz parte do nosso património religioso e cultural a mentira piedosa que a Rainha D. Isabel pregou ao seu marido, El-Rei D. Dinis. Uma lenda que sempre entusiasma quem a ouve.

Vem isto a propósito ou a despropósito do turismo nos Açores. Considerado um potencial de desenvolvimento económico tem-se sobre ele mantido algumas mentiras piedosas.

Analisando-o sob a perspectiva do aumento do numero de camas e de dormidas tem-se defendido a tese de que o sector mantêm um bom crescimento e que as perspectivas de futuro são animadoras.

Mas basta uma pequena rabanada de vento como a paragem da vinda para São Miguel dos suecos para que seja claro que o negócio do turismo é uma actividade de 3 meses. E o que o resto é um arrastar-se para aí.

O turismo na Região tem inegáveis potencialidades porque temos recursos naturais únicos na Europa e uma estabilidade e segurança invejáveis sendo que os segmentos do turismo de natureza e bem-estar são os que mais crescem.

Contudo os transportes mantêm-se exorbitantemente caros e as acessibilidades inadequadas, faltando um conceito que venha dar uma resposta estruturante para as longuíssimas noites da época baixa.

As mais-valias acumuladas nos três meses de Verão são, rapidamente, comidas pelas despesas do exercício da actividade no longo período em que procura cai abruptamente.

E assim o investimento fica-se mesmo por aí. Sendo bom quando já é possível assegurar as despesas fixas e o serviço da dívida durante todo o ano. Reinvestir torna-se, por conseguinte, crescentemente problemático.

O turismo precisa nos Açores de um grande abanão.

Sendo essencial criar um verdadeiro “brainstorming” que envolva agentes económicos, políticos e, por fim, profissionais internacionais do turismo vocacionados para estabelecer diagnósticos e propor medidas.

Iniciativa e custos que devem caber ao Governo Regional que agora encetou funções e que precisa de encontrar uma resposta cosmopolita, criativa e global para o sector.

Dizer que são rosas o que, verdadeiramente, são espinhos não colhe e, muito menos, serve um objectivo nobre como o defendido pela Rainha D. Isabel. Sendo certo que os tempos são de crise podem, por isso mesmo, aguçar o engenho e a arte.

Fica o desafio.


P E D R O D A M A S C E N O

sexta-feira, julho 10, 2009

O Amor em tempo de crise

Em Portugal a aventura acaba na pastelaria
Alexandre O’Neill



O Amor em tempo de crise



De vento em popa lá se foi, ou vai indo, o amor à antiga portuguesa! Um amor previsível e seguro, embora cheio de alçapões, enganos e desenganos. “Amor” de vida inteira, com uma outra facadita à mistura.

Amor de papel assinado e bênção de eterna fidelidade. O homem angariador e dominante, a mulher submissa e mãe de filhos. Deus, Pátria, Família: a Trilogia da Educação Nacional. O lar perfeito, rústico, humilde, analfabeto, patriarcal e cristão.

Sendo certo que nessa altura já havia os ballet rose e outras perversidades do regime que eram, contudo, apenas usufruídas pelos privilegiados dos corredores do poder. E, claro, a burguesia urbana que já fugia ao cenário edílico do mundo rural e agrícola.

25 de Abril, revolução dos cravos e do costumes.

Em pouco mais de trinta anos passa-se de oito para oitenta. A pornografia irrompe nos mais longínquos lugarejos e a televisão torna-se no omnipotente omnipresente meio de comunicação que ainda hoje é.

A mulher assume, progressivamente, um papel socialmente relevante e invade as universidades em que detêm, hoje, uma maioria qualificada. E com a emancipação e a liberdade vêm, inevitavelmente, uma reviravolta radical nos costumes.

A Igreja Católica perde pé e passa a não conseguir impor a sua ortodoxia moralista que durante anos lhe garantiu um lugar privilegiado à mesa dos poderosos. Incapaz de se adaptar aos novos tempos perde sacerdotes e influência.

A moral e o sexo liberalizam-se e o divórcio assume carácter da maior naturalidade. As relações de facto vulgarizam-se estimando-se que no presente já ultrapassam os casamentos. O sexo pré marital tornou-se uma “pandemia”!

A homossexualidade sai do armário e torna-se num lóbi poderoso que já conquistou em muitos países o direito ao casamento. Sendo previsível que o mesmo venha a acontecer em Portugal a curto prazo.

O casamento e a família como as conhecíamos tornaram-se em instituições em vias de desagregação. E, como tudo está em grande ebulição, ainda se não enxerga bem o futuro: famílias mono parentais, pluri parentais, homossexuais, transsexuais?

E o amor? Esse certamente continua, mas irrompe das maneiras mais diversas possíveis. Sem as mascaras de uma sexualidade reprimida ou de sentimentos de culpa, pleno de desejo e de paixão. Saltando os paredões da convenção e assumindo a descoberta.

O amor e a paixão são intemporais mas, como quase tudo o resto, não estarão a resvalar para o “fast” e o descartável? Talvez por isso o amor on-line se tenha tornado quase mais popular do que o propriamente dito.

Os meios de comunicação e a rapidez das telecomunicações tornaram o mundo numa aldeia global mas a comunicação pessoal e directa parece ter-se vido a tornar mais difícil. Passam-se horas no telemóvel e na Internet mas a qualidade da comunicação parece ter piorado.

Ter-se-á somado à crise económica uma crise de afectos de proporções igualmente preocupantes? Será que o consumismo terá inquinado também o coração e o deixado à mercê dos mercados volúveis da moda e do politicamente correcto?


P E D R O D A M A S C E N O

sexta-feira, abril 24, 2009

Turismo em tempo de crise

Turismo em tempo de crise

São previsíveis dificuldades no turismo açoriano, como em todo o lado. A retracção do consumo irá, inevitavelmente, reflectir-se num sector de actividade que dele tanto depende.

Não sendo as férias e o passear uma prioridade de primeira linha para a generalidade das pessoas será uma das despesas a reduzir nos orçamentos familiares, mesmo em países de maior desafogo.

Os Açores, sendo um destino caro, não estarão na primeira linha das opções de férias de muita gente. Sobretudo no nosso mercado emissor mais importante que continua, ainda, a ser o continental.

Mas as crises, como tudo na vida, têm coisas más e boas. E, neste caso, as boas serão a possibilidade de reflectirmos, calmamente, na sustentabilidade do nosso modelo de desenvolvimento turístico.

Embora sustentabilidade seja uma palavra que muito se poluiu de tanto ser usada, a propósito de tudo e de nada, não deixa de ser um conceito inteiramente actual e indispensável ao progresso.

Tempos de vacas gordas, geralmente, não convidam muito á reflexão. Estando toda a gente mais ou menos bem, não importa muito filosofar. Nem que se esteja a correr no fio da navalha.

E foi um pouco o que aconteceu na Região. A SATA Internacional tornou-se uma realidade de mais valia – sobretudo pela abertura de rotas directas para os Açores, os mercados emissores expandiram-se e o número de camas e dormidas explodiu.

De um destino quase desconhecido passamos a ter níveis de notoriedade interessantes que foram ampliados por alguns reconhecimentos internacionais como o selecção da vinha do Pico como património mundial ou o painel da National Geographic.

Sendo certo que o aumento exponencial de camas turísticas dos Açores não teve como base um aumento sólido da procura nem se fez com base num conceito de turismo devidamente identificado.

Cresceu-se e pronto.

Agora, em tempo de vacas magras, será a melhor altura para avaliar o que foi feito e para programar o futuro com base numa análise de mercado rigorosa e num conceito que resulte da experiência acumulada, da sensibilidade dos agentes económicos e da vontade dos políticos.

A excessiva confiança não deverá dar lugar ao desânimo. Os Açores são um destino com inegáveis potencialidades nos mercados já estabilizados e noutros – que urge explorar – como os americano e canadiano.

Seria interessante organizar, ao nível da Região, uma mega operação de reflexão sobre o que temos, o que devemos fazer e para onde queremos ir. E tempos de crise são, por natureza, os mais criativos ou não fosse a necessidade a melhor forma de aguçar o engenho.



P E D R O D A M A S C E N O

sexta-feira, março 27, 2009

O preservativo da discordia

O preservativo da discórdia


Poderá parecer excessivo voltar à questão das declarações do Papa Bento XVI a propósito do uso do preservativo. Contudo foram feitas no âmbito da sua visita a África, continente aonde vivem 70% dos infectados com a Sida.

Uma epidemia de proporções colossais e cuja erradicação passa pela tomada de medidas muito drásticas e que não se compadecem com leituras da vida completamente desajustados dos dias em que vivemos.

Tecnicamente é um facto indiscutível que a prevenção primária da Sida, para além da irrealista abstinência, passa pela utilização de uma barreira física que impeça a contaminação. E que essa barreira se chama preservativo.

Esta é, por conseguinte, uma questão básica de Saúde Pública. Que tem levado a que a generalidade dos países ocidentais faça campanhas de utilização do preservativo. Com o apoio explicito e activo da Organização Mundial de Saúde.

O que difere a Sida de outras doenças contagiosas também muito graves é o facto de ser uma doença tipicamente adquirida por via sexual, embora o possa ser de outros modos. Facto que não a desqualifica como um verdadeiro flagelo.

Sendo o sexo a forma, habitual e corrente, de propagar a espécie humana e, simultaneamente, o resultado de um dos instintos nucleares do homo sapiens fácil será perceber que o combate à Sida tem pela frente um obstáculo formidável.

Tentar limitar o seu combate à abstinência sexual e a monogamia será, pelo menos, tão difícil como abrir, outra vez, as águas do Mar Vermelho. Sobretudo se atendermos a culturas tão diferentes, perante o sexo, como as africanas.

A questão da utilização do preservativo é, desse modo, uma questão que ultrapassa de todo as questões da moral em abstracto para se ter tornado num imperativo cívico para quem quer erradicar uma doença tão grave e que atinge milhões de inocentes, nomeadamente crianças.

A Igreja Católica tem como organização religiosa tem todo o direito de assumir as posturas morais que entender adequadas mas não deveria em nome dessas posturas fazer contracorrente em relação a uma medida de prevenção da doença tão importante como é preservativo.

O Papa, em vésperas de visitar África, poderia ter escolhido outro tema mais adequado como as ditaduras, a corrupção e a miséria. Situações endémicas nesse continente tão prodigioso e, ao mesmo tempo, tão carente.

A mensagem de Cristo foi – exemplarmente – uma mensagem de compaixão e solidariedade. Um Cristo humilde e profundamente tolerante que fez do amor o centro da sua vida.

Custa, agora, ver o seu sucessor perorar, do alto dos seus brocados, sobre uma moral pequenina que vê o mundo através do buraco da fechadura do Vaticano e se esquece do mundo de sofrimento e miséria que gravita em torno de uma doença perfeitamente evitável.


P E D R O D A M A S C E N O

sexta-feira, março 13, 2009

Criar Riqueza

Para distribuir é preciso criar riqueza.
José antónio saraiva



Criar Riqueza


São impressionantes palavras recentes de Francisco Louçã. A propósito de uma operação de crédito da CGD afirmou que os 62 milhões dados a um empresário dariam para pagar 100 mil subsídios de desemprego.

Não se sabendo se os 62 milhões foram efectivamente dados a um empresário, esse dado também não é essencial. Porque a crítica não veio no sentido de saber se esse empresário cria riqueza real e postos de trabalho.

Até pode ter sido uma daquelas de situações de compadrio de “alta finança” que têm assolado a país e a comunidade internacional. Até pode ter sido uma daquelas situações em que foi o empresário a lucrar pessoalmente com a negociata.

E aí, temos que concordar, teria que haver responsáveis sobretudo por se tratar da CGD que é na prática o Banco do Estado. Mas o que ressaltou do que disse Louçã não foi o protesto por uma eventual falcatrua ou um negócio doloso.

A crítica veio para defender a tese da subsidiação do desemprego como se este fosse combatível por essa via. O desemprego existe, tem crescido e ameaça tornar-se um problema social da maior gravidade. Quer em Portugal quer no mundo.

Sendo essencial combater o desemprego como é indispensável ajudar quem realmente não o tem ou a ele não tem genuinamente acesso. Porque o subsídio de desemprego ainda representa para muita gente uma forma de garantir absentismo.

A precariedade e escassez de emprego são hoje realidades incontornáveis. Mas essa realidade combate-se criando riqueza que permita assegurar postos de trabalho e quem cria riqueza são, salvo melhor opinião e correlativa demonstração, os empreendedores e os empresários.

O Estado cria postos de trabalho que são necessários ao funcionamento do país mas todos bem sabemos que se tratam de postos de trabalho sui generis para não lhes chamar outra coisa. Sui generis porque não se baseiam numa lógica de produção-remuneração-responsabilização-manutenção.

São postos de trabalhos vitalícios e inamovíveis. Muito pouco ou nada dependentes de qualquer cadeia hierárquica e disciplinadora e que usufruem de uma política de reformas inexistente para quem trabalha por conta de outrem na privada.

Esses postos de trabalho não dependem nem do mercado e, muito menos, da boa gestão. Dependem do orçamento do estado e como este, em princípio não vai à falência os outros factores não são relevantes.

Mas os postos de trabalho públicos são finitos.

E para criar postos de trabalho é necessário criar riqueza. Porque para os remunerar há que ter dinheiro e não há dinheiro, de forma sustentada, que não corresponda a criação de riqueza. Riqueza que aliás possibilita ao estado a cobrança de impostos, fonte essencial da sua receita.

De modo que impressiona que Louçã, um economista e universitário, venha usar tão infantil demagogia. Tudo o que é mau é mau, sejam políticos empresários, banqueiros, trabalhadores, etc. Não há, apenas, bons de um lado e maus do outro.

Postos de trabalho só se atingem criando riqueza e a iniciativa privada é o seu motor. Axioma que a própria China já percebeu. Quando será que alguns dos nossos putativos políticos de esquerda vão perceber isso e emergir no século XXI?


PEDRO DAMASCENO

sexta-feira, fevereiro 27, 2009

O fim de um paradigma

Acredito que só sairemos verdadeiramente da crise com sangue, suor e lágrimas
Miguel Sousa Tavares




O fim de um paradigma



Comunismo de um lado, capitalismo do outro. A queda do muro de Berlim e a implosão do comunismo. O regabofe do capitalismo desregulado e de casino, totalmente unilateralista.

Um “directório de países ricos” com pouca ou nula sensibilidade para um conjunto interminável de países miseráveis. Uma visão maniqueísta de um mundo desigual, injusto e explosivo.

A ascensão do capitalismo sem regras capitaneado pela Administração Bush – provinciana e conservadora – que encontrou no terrorismo o argumento para uma política externa totalmente desastrada. A queda abrupta dos valores e dos princípios.

O fim das ideologias que se condensariam, agora, num capitalismo mais ou menos mitigado. Sendo essa coisa de direitas e esquerdas, por conseguinte, pura estultice intelectual desprovida de carácter prático.

O estado social e do bem-estar, menina dos olhos da social-democracia europeia (e sobretudo nórdica), entrando em colapso progressivo com previsões muito negativas sobre a sua sustentabilidade.

Os políticos a perderem densidade e credibilidade tornando-se em mais um bem descartável ao sabor das sondagens e dos votos. Uma crescente promiscuidade entre poder político e poder económico e a rarefacção de verdadeiros estadistas.

A crise surge. Ou melhor, o moderno capitalismo como o vínhamos conhecendo colapsa – quase de repente – deixando o menino nas mãos do estado que, entretanto, perdera a sua vocação de protector e regulador da economia.

Gurus da nova economia e do seu crescimento exponencial passam de heróis a malfeitores de direito comum. Os bancos e seguradoras abrem falência em catapulta e os offshores aparecem como os tentáculos mais visíveis da fraude generalizada.

E agora, Pedro?

Agora, como disse Barack Obama, “é preciso mudar o modelo económico”. Procurando um novo paradigma que mantenha e aprofunde as liberdades individuais e a economia de mercado mas que introduza factores de carácter ético, social e ambiental.

Criar, como disse Mário Soares, “ estados de direito capazes de controlar os mercados e assegurar sociedades de cidadãos livres, pluralistas e participantes, democracias não oligárquicas mas sociais, preocupadas com o bem-estar de todos, com uma justiça independente, acima dos média, e com a defesa do ambiente, indispensável à sobrevivência da humanidade e da biodiversidade”.

Iniciativa privada que terá que se manter como o motor da economia mas apostando num capitalismo inventivo e criador de riqueza para todos em detrimento de um capitalismo especulativo só para alguns. Com regras claras devidamente supervisionadas pelo estado e asseguradas por uma justiça célere, competente e independente.

É adequado anunciar o fim de um paradigma.

Há que esperar, agora, que uma massa crítica de cidadãos – activos, lúcidos, sensíveis e empenhados – ponha em marcha outro que tome em conta os erros e desvios do passado e consiga retomar, tendo em linha de conta os desafios da modernidade, o fio interrompido dos grandes valores da Revolução Francesa: Liberdade, Igualdade, e Fraternidade!



P E D R O D A M A S C E N O

sexta-feira, fevereiro 13, 2009

A teologia dos autocarros

Deus existe? Em Madrid, isso depende do autocarro!
Nuno Ribeiro (Público)




A teologia dos autocarros


Madrid ameaça tornar-se no epicentro de uma verdadeira erupção teológica! Erupção que surge em forma de cartazes de publicidade colocados em oito autocarros de cinco linhas daquela cidade.

Em publicidade paga seis desses autocarros defendem a existência de Deus enquanto dois defendem o oposto. Todos eles com slogans alusivos: “Deus Existe”; “Provavelmente Deus não existe. Deixas as preocupações para trás e goza a vida”; “Quando todos te abandonam, Deus fica a teu lado”.

Todos eles da maior profundidade e que vêm repor a teologia como matéria nobre das horas de ponta da movimentada cidade espanhola. Podendo os cidadãos, entre a leitura apressada do jornal e as secas de espera nas paragens, aprofundar a sua espiritualidade.

Quiçá mesmo discernir finalmente, por entre anúncios de detergentes e perfumes lascivos, o significado supremo da vida. Se podemos, por exemplo, gozar a vida porque Deus não existe ou se não nos devemos preocupar com nada porque Ele existe e não nos deixa sozinhos.

A campanha começou em Londres por iniciativa da British Humanist Association do Reino Unido e estendeu-se a Espanha prometendo chegar a Sevilha, Valência, Saragoça e Bilbau. E porque não Lisboa, Porto, Coimbra e Faro?

Uma espécie de teologia do povo aligeirada ao estilo de fast-food espiritual. Para quê entrar em horrendas discussões académicas ou tentar ler livros chatíssimos como a Bíblia ou o Alcorão que nos põem a dormir em dois tempos?

Quando a coisa é bem mais simples: deixar de acreditar em Deus para gozar ou então simplesmente acreditar em Deus para ser feliz. Elementar.


Sendo estas questões assim simples porque não tornar os autocarros de Madrid – e mesmo do mundo – no fórum ideal para a discussão da existência ou não de Deus. Poupa-se balúrdios em peregrinações, templos, ordenados e velas.

E Deus, se existe, deve estar algures no Paraíso, morto de riso. Porque tendo-nos feito, à Sua imagem e semelhança, não resistiu a dotar-nos de uma pitada de sentido de humor que agora rende boas gargalhadas. Se não existe teremos que nos rir por conta própria.

E, claro, escolher entre se existe Deus ou não existe terá a ver com a qualidade visual e estética dos anúncios, com as cores com o lettering, etc. E porque não, no futuro, com mulheres boas nuas? Se servem para vender tudo, desde a carros a electrodomésticos, também podem servir para vender umas Sodomas e Gomorras modernas ou a castidade envolta em hard-rock.

A opção é nossa mas, no fundo, tanto faz. A felicidade/gozo está certa, com ou sem Deus. Uns porque sim e os outros porque não.

Resta-nos a consolação (pelo menos nesta parte do mundo) de poder escrever jocosamente sobre tudo isso sem termos de enfrentar amanha uma manifestação ululante de desagravo ou uma sentença de morte, decretada à revelia.

Está tudo, garantidamente, doido.


P E D R O D A M A S C E N O

sexta-feira, janeiro 30, 2009

Eu, também, tenho um sonho!

I have a dream!
Martin Luther King Jr.




Eu, também, tenho um sonho!


Anos de 2008, 2009, 2010 (?) …. de crise, de recessão e de outros tantos palavrões que, ao fim e ao cabo, significam ainda mais dificuldades para quem já não estava muito bem.

O fim do fantasia do capitalismo sempre em crescimento e do dinheiro fácil. O fim do conto do vigário planetário com dinheiro gerando dinheiro sem criação de riqueza.

Não o fim do capitalismo, enquanto sistema baseado no principio da propriedade privada dos meios de produção e na livre iniciativa. Porque esse está para ficar e para durar.

Como a própria democracia, o capitalismo é o mal menor. Não sendo perfeito foi o sistema que permitiu avanços notáveis à humanidade e possibilitou o acesso à riqueza e bem-estar a um número recorde de pessoas.

Mas tinha, no seio, perversidades que vieram, agora, manifestar-se de uma forma incontornável. Sendo a corrupção generalizada, porventura, a mais grave. Essencialmente porque abarcou quem devia assegurar o funcionamento equilibrado do sistema.

Sendo a matriz cultural de tudo isso o endeusamento do consumo como forma suprema de felicidade e o estatuto social/económico com o meta última do sucesso. Deixando para trás as palavras luminosas de Albert Einsten: tenta ser um homem de valor em vez de tentares ser um homem de sucesso.

Eu, também, tenho um sonho!

Que esta crise/recessão tenha o condão de abrir o coração e a mente de um número crítico de pessoas. Que os faça perceber que o que se passou e está a passar é a falência da ambição desmedida, sem princípios e sem alma.

Porque a crise não é só financeira e moral é, também, ambiental. Sendo esta bem mais grave porque atinge o planeta, a nossa casa colectiva. Viver com pouco dinheiro e sem princípios é difícil mas viver sem as condições naturais indispensáveis à vida é impossível.

A delapidação dos nossos recursos naturais é uma realidade, de consequências práticas da maior gravidade, que já não é possível ignorar por mais tempo. As palavras avisadas, de quem tem lutado na linha da frente do ambientalismo, têm plena confirmação.

Eu tenho um sonho que um número crítico de pessoas perceba que o fosso de riqueza e bem-estar entre nações e pessoas só augura conflitos e violência. Que perceba que não pode haver paz aonde não há pão que chegue.

Que perceba que temos que por um ponto final á nossa ambição de ter cada vez mais e mais. Que o nosso patamar de conforto, segurança e prosperidade tem que ter como limites um mínimo de dignidade para todo e qualquer ser humano e a preservação do planeta.

Que um número crítico de pessoas deixe de desbaratar no supérfluo e se empenhe, de forma pro-activa, em actividades cívicas e políticas que consigam moralizar o nosso sistema corrupto e decadente.

Que um número crítico de pessoas volte aos princípios e aos valores para engrossar o número daqueles que – vindo das mais variadas origens ideológicas ou confessionais – já estão empenhados na mudança indispensável e urgente mas, também, possível.

Eu, também, tenho um sonho!



P E D R O D A M A S C E N O

sexta-feira, janeiro 23, 2009

Boa, Senhor Cardeal Patriarca de Lisboa!

Quem é que em Portugal já leu o Alcorão?
Cardeal Patriarca de Lisboa



Boa, Senhor Cardeal Patriarca de Lisboa!


A tempestade num copo de água, gerada por alguns comentários recentes sobre muçulmanos proferidos pelo Cardeal Patriarca de Lisboa, suscita algumas reflexões sobre o tema das religiões e do diálogo entre elas.

O que o Cardeal Patriarca disse, em tom descontraído e coloquial, foi: Cautela com os amores, pensem duas vezes em casar com um muçulmano, pensem; pensem muito seriamente. É meter-se num monte de sarilhos, nem Alá sabe onde é que acabam.

O que não sendo politicamente correcto é de grande bom senso e uma dose apreciável de coragem. Coragem que falta, muitas vezes, em nome de uma tolerância para quem não tem qualquer dose da dita. Ou, novamente, nas palavras do Cardeal: só é possível dialogar com quem quer dialogar e com os nossos irmãos muçulmanos o diálogo é muito difícil.

Palavras certeiras num mundo que se verga ao fundamentalismo islâmico que trouxe à era moderna uma onda de insegurança e intolerância como há muito não era visto.

Claro que a religião muçulmana em si, especialmente o Corão, não é exclusivamente representada por essa intimidação a uma escala mundial. Há, com certeza, milhares de muçulmanos que não se revêem nesse radicalismo. Gente que segue a religião com sentido de tolerância e amor.

Sobre isso não deverá haver dúvidas. Sobretudo os muçulmanos que vivem em países democratas que não são, sem excepção, muçulmanos. Porque os países assumidamente muçulmanos não são, também sem excepção, democratas.

Sendo possível que uma jovem católica ou de qualquer outra religião se possa casar com um muçulmano moderado e usufruir, num país não muçulmano, de uma relação plena de respeito e tolerância é muito difícil que tal possa acontecer num país do eixo islâmico fundamentalista.
E foi positivo que uma pessoa com as responsabilidades do Cardeal Patriarca tivesse feito essa chamada de atenção. Porque as vozes muçulmanas moderadas não devem conseguir chegar ao céu, esmagadas pelo ruído ensurdecedor dos sectores radicais.

Nada como chamar os bois pelos nomes. Sendo de apreciar que tal tenha vindo do mais alto responsável de uma Igreja que não nos habituou, propriamente, à frontalidade. Desta vez os paninhos quentes ficaram a aguardar melhor oportunidade.

É indispensável denunciar publicamente as teocracias que em nome de Deus espalham e fomentam o ódio como se tal fizesse qualquer sentido. Deus que nunca publicamente se veio manifestar, pelo menos nos tempos modernos.

Como D. José Policarpo disse, só é possível dialogar com quer dialogar. E já agora, acrescento eu, com quem procura o caminho da paz. Nunca com quem procura o confronto, a violência e o terrorismo.

Nem todos os muçulmanos são terroristas. Bem verdade. Mas hoje não restam dúvidas que o fundamentalismo islâmico – única voz do Islão que se consegue ouvir – é o seu grande patrocinador.



PEDRO DAMASCENO

sexta-feira, janeiro 09, 2009

Crise à Portuguesa

Crise à Portuguesa


Não há hipótese: levamos com a crise de manha, à tarde e a noite. Não há noticiário que se preze nem canal que se tenha em boa conta que não nos inunda com mais desgraças: falências, burlas, despedimentos, processos de tribunal, etc., etc.

A crise institucionalizou-se e tornou-se, juntamente com Gaza e o tempo frio, o tema genérico das conversas. A tal ponto que já começa a ser tratada de forma brejeira e despiciente. E não começarão a faltar as anedotas.

Ao fim e ao cabo a crise é um tema recorrente na sociedade portuguesa. Esta é diferente apenas pela sua componente internacional. Mas de resto continuamos a produzir e a investir pouco e a viver acima das nossas possibilidades.

A especulação e a burla financeira em Portugal já têm dentes. De tal modo que chamaram D. Branca a Bernard L. Madoff, o suposto mago financeiro de Wall Street que, pelos vistos, não passava de um grande vigarista que – só a Portugal – fez perder 96 milhões de euros!

De resto um esquema de jogo financeiro baseado no conceito de pirâmide (pagamento de juros elevados aos investidores mais antigos feito com o dinheiro dos mais recentes) ainda há meses circulava em Portugal com grande sucesso. E já a crise estava ao dobrar da esquina…

Ou seja: crise existe mesmo mas a generalidade dos portugueses parece ainda achar que isso tem a ver com uma meia dúzia de ricaços ambiciosos e uns bancos sem escrúpulos e muito pouco com o comum dos mortais que continua a fazer a vidinha que sempre fez.

A vidinha de cada um por si e Deus por todos. Até ir votar é uma chatisse porque os políticos são todos parecidos e é melhor um dia de praia, uma tarde a ver telenovelas ou um dia de conversas de chacha no café. Como assim, o voto não vai mudar nada.

No Natal de 2008 foi levantado mais dinheiro, nas caixas Multibanco, do que ano de 2007! Para o grande público, possivelmente, ainda se estava/ou está em mais uma daquelas situações em que o pastor veio dar o sinal falso de alarme de lobo. Ou será apenas um faz de conta?

E nós somos mestres em fazer de conta.

A crise existe, é grave e não se deve apenas à especulação financeira, às falcatruas das grandes empresas, aos paraísos fiscais e à falta de regulação dos mercados. A crise deve-se, também, a um modelo de consumo e esbanjamento das nossas sociedades ocidentais, dos países dito desenvolvidos – num caldo de perspectivas de crescimento irrealistas.

E as soluções não estão, apenas, com os economistas e os políticos. As soluções passam, também, por todos nós que elegemos os políticos e que, por essa via, decidimos persistir num modelo de sociedade em que os valores supremos são o dinheiro e o bem-estar material num contexto do menor trabalho possível.

Esse modelo não era viável e implodiu.

Só uma solução de compromisso entre as nossas expectativas de conforto e os imperativos sociais – nacionais e internacionais – poderão tornar possível um modelo realista. Em que as diferenças entre as pessoas e entre as nações sejam atenuadas para níveis aceitáveis.

Arregaçar as mangas, prescindir do supérfluo e assumir uma cidadania responsável/interventiva serão ferramentas ao alcance de todos e que poderão fazer a diferença. Meter a cabeça na areia e esperar que a crise passe não prenuncia nada de bom.

Longe vai, felizmente, o tempo dos homens providenciais.




P E D R O D A M A S C E N O