FACE
OCULTA
UMA QUESTÃO DE SENSIBILIDADE E BOM
SENSO
Infelizmente mais dois promissores
jovens picoenses perderam a visa num trágico acidente de viação. O que vem,
mais uma vez, chamar a atenção – para quem quiser ver – sobre os perigos que as
estradas escondem, quer seja sob forma de potentes motos quer seja sob forma de
um voluntarismo de condução que a maioria dos jovens tem.
Ninguém quer morrer mas poucos
pensam, até pela idade, no perigo.
Mas, infelizmente também, não foram
apenas duas vidas que se perderam. Foram, também, algumas vicissitudes que as
famílias sofreram para poderem passar as derradeiras horas juntos dos seus
filhos. O que acabou por ter sido possível apenas porque se conseguiram reunir
um conjunto de boas vontades (desde os médicos até à entidade judicial).
Não se questionam, naturalmente, nem
a legitimidade nem a competência de quem ordenou a autópsia nem tão pouco se
pretende atribuir-lhe culpas +ela falta de condições locais (inexistência de
uma morgue com um mínimo de condições) para fazer face – de forma digna – a
situações legais incontornáveis.
O que se questiona, isso sim e não
pela primeira vez, é a falta de condições locais para responder, de forma
digna, a situações excepcionais (a hora tardia do óbito e os condicionalismos
extremamente emotivos gerados pela idade dos sinistrados) se junte uma falta de
filosofia de fundo que se preocupe em lidar de forma específica com as diversas
situações.
Porque se não tivesse sido possível
reunir o conjunto de boas vontades que acima se referiram, as jovens vítimas
teriam permanecido pelos menos 30 horas encerrados numa garagem a servir de
morgue sem poderem ser acompanhados nem sequer pelos próprios pais que se
teriam limitado a ver, pela derradeira vez, os filhos mesmo em cima do funeral!
E, no entanto, é de mais elementar
justiça poupar pais e amigos e mais essa provação extra. Ninguém tem culpa –
nem os que morreram nem os que ficaram - que o acidente tenha ocorrido de
madrugada e que portanto o térmito das 24 horas que a lei prescreve ocorra
também de madrugada. Mas é importante criar a cultura de suprir, de forma mais
célere e expedita, os requisitos legais.
Requisitos legais que têm que ser,
indiscutivelmente, cumpridos mas que não têm que, necessariamente, ignorar
questões emocionais e culturais da maior relevância.
Nos grandes meios onde tudo é mais
impessoal talvez tudo possa acontecer de forma diferente, também mais
impessoal. Mas no Pico a ilha ficou literalmente de luto, atordoada na sua
pequenez e no seu pessoalismo.
Não é objectivo desta crónica
descortinar responsabilidades nem descobrir culpados do que quer que seja. Mas
tão somente chamar a atenção para um tipo de situação que já ocorreu e que
poderá, infelizmente, vir a repetir-se.
A questão da morgue/morgues (?) do
Pico tem que se devidamente equacionada de modo a que no futuro as pessoas
possam ter a possibilidade de acompanhar com dignidade os seus defuntos e não
terem que, eventualmente, disso serem privados permanecendo, literalmente, à
chuva e vento.
A lei tem que ser cumprida mas as
pessoas, mesmo depois de mortas, têm de ser respeitadas.
Ao fim e ao cabo é uma questão de
sensibilidade e de bom senso e para a qual se chama a atenção dos
intervenientes mais responsáveis, nomeadamente do Ministério da Justiça e da
Secretaria Regional da Saúde e Segurança Social.
P
E D R O DA M A S C E N O