segunda-feira, setembro 22, 2003

Consumir até onde?

Consumir até onde?



Uma vez satisfeitas as necessidade básicas, dinheiro não tem nada a ver com felicidade
Oliver James



Saudando todas as manifestações de progresso económico – enquanto formas saudáveis e sustentáveis de assegurar o progresso social e cultural – parece ser da maior importância reflectir um pouco sobre a “fome” de consumo que começou, visIvelmente, a tomar conta das nossa vidas de ilhéus.

A chegada à nossas terras da cultura do excesso que nos está a atirar, também, para um espiral interminável de compras deve suscitar algumas perguntas quase ingénuas. Quantos pares de sapatos e trapos precisa, realmente, uma pessoa? Quantos carros? Quantas televisões? Perguntas, talvez ingénuas, mas que ninguém se atreve a perguntar numa cultura que estimula o consumo desenfreado e a satisfação imediata dos desejos individuais, por mais disparatados ou fúteis que possam ser.

Atitudes e práticas comunitárias, partilha, sentido de poupança e reciclagem são conceitos que não aumentam a procura de bens de consumo nem tão pouco estimulam o designado “crescimento económico”. Pelo que preferimos ignorar os sinais de aviso – aumento da violência, das depressões, dos suicídios, dos comprtamentos compulsivos – que nos chegam dos “paraísos” de consumo. Ficando-nos por questões bem mais comezinhas como assegurar uma televisão em cada quarto de cada criancinha ou comprar mais um electrodoméstico desnecessário.

O que leva à aparente contradição que afecta, crescentemente as nossas sociedades ocidentais: uma probreza espiritual aguda no meio de prosperidade material inaudita. Enquanto que a nossa qualidade de vida se degrada em virtude de um insaciável apetite por bens materiais, bem aguçado pela publicidade que nos assalta por todo lado (agora até nas casa de banho?) e nos cria novas insatisfações que nos levam a comprar mais.

Levando a situações caricatas como a da existência de um programa de televisão inglês que se propõe ajudar os espectadores a desembaraçarem-se das coisas desnecessárias acumuladas em casa! Obviamente escamoteando a questão de fundo: não comprar desmedidamente coisas desnecessárias apenas por causa dum anúncio ou de manter a paridade com o vizinho do lado! Daí que a aquisição demesurada de bens materiais não faz parte da solução que vise assegurar o crescimento económico, sustentável e socialmente, justo mas sim parte do problema.

Levando a que um dos grandes dilemas da “prosperidade” seja o que de que quanto mais tens mais queres não tendo sido possível encontrar consenso, mesmo em países bem mais ricos que o nosso, para encontrar patamares de conforto e bem estar e que, simultaneamente, satisfaçam as pessoas e permitam parar com a exploração desenfreada do planeta – nossa única e verdadeira casa. Mas que, pelo contrário, que o “virus” do consumismo do nosso estilo de vida ocidental se esteja e espalhar pelo mundo a ponto do presidente chinês ter apontado como meta para 2020 quadriplicar o PIB da China, obviamente através do aumento do consumo dos cidadãos!

Talvez que uma das vacinas possíveis para esse virús seja alimentar a nossa espiritualidade e, por aí, redefinir os nossos conceitos de qualidade de vida, medindo a prosperidade não apenas pelo crescimento contínuo do PIB mas por outros parametros nada menos importantes: ar e água puros, boa saúde, biodiversidade assegurada, paz e tranquilidade, etc, etc. Pelo que seria importante retomar velhos hábitos que, na nossa terra, ainda não estão tão distantes: deixar de nos preocuparmos tanto com o que não temos para nos preocuparmos mais com o que podemos partilhar.

Deixando no ar não a pergunta sacramental de quanto temos e até onde podemos consumir mas aquela que é, efectivamente, crucial: até onde vão o planeta e as comunidades que nele vivem aguentar?

P E D R O D A M A S C E N O

Para uma Secretaria Regional do Ambiente e turismo



Para uma Secretaria Regional do Ambiente e Turismo
Passar das palavras aos actos


A cerca de um ano de eleições legislativas regionais começa a ser necessário “aquecer os motores” e, o mesmo é dizer, que novas propostas políticas surjam e que os partidos que as vão disputar se mostrem inovadores. Para além das pessoas que teremos que escolher para nos governar há que optar pelas políticas e objectivos estratégicos que melhor sirvam os interesses do nosso desenvolvimento integral.

E falar em desenvolvimento integral (económico, social e cultural) no Açores é quase sinónimo de falar em Ambiente e Turismo. Ambiente porque é o nosso grande património, a nossa verdadeira galinha de ovos de ouro e Turismo porque é o sector que poderá ser a chave do nosso crescimento económico sustentável.

Depois dos ciclos da laranja e da vaca (com os impactos florestais e hídricos negativos que se conhecem) o caminho para a Região é o turismo que deverá ser o motor da economia bem como o grande defensor do ambiente e dos nossos recursos naturais. Porque turismo pode e deve ser uma actividade catalisadora de um ordenamento cuidado e de intervenções que venham melhorar inúmeras zonas abandonadas e/ou descuidadas que existem por todos os Açores.

O discurso do ambiente e da defesa da natureza tem de passar das palavras aos actos. A criação da Secretaria Regional do Ambiente foi, sem dúvida, um passo importante, mas não suficiente. Não suficiente pela falta de meios e por não pesar ainda, como devia, na vida económica da Região. O Ambiente já faz parte do discurso politicamente correcto mas continua a ser um sector marginal em vez de ser, como devia, uma área perfeitamente central na vida económica dos Açores.

O grande potencial da Região é, indiscutivelmente, a qualidade do nossa natureza (infelizmente já com “feridas” lamentáveis aqui e ali). Nisso toda a gente parece estar de acordo. E é, precisamente, essa a grande mais valia que nos poderá pôr no mapa do turismo europeu e americano (mercado, a nosso ver, com grandes potencialidades). O que implica uma política ambiental e de ordenamento extremamente rigorosa para além de conceitos hoteleiros e turísticos virados para o turismo de natureza e de usufruto do mar.


Por outro lado, o turismo não é, necessariamente, uma sentença de morte para o ambiente e qualidade de vida. Se é certo que em muitos casos o foi – veja-se o exemplo paradigmático do Algarve que em pouco mais de 30 anos rebentou pelas costuras – em muitos outros (por exemplo a Patagônia, a Bolívia e Lanzarote ) foi a maneira de financiar um melhor ordenamento e dar vocação financeira a zonas que, à partida, se apresentavam problemáticas em termos de desenvolvimento.

Mas é sabido que a natureza e o ambiente não são actividades que sejam, por si só, rentáveis. Daqui que caiba um papel fundamental ao Estado que terá que dispor de recursos financeiros apreciáveis para esse fim. Preservar e ordenar o ambiente tem custos elevados. E para que isso não passe de uma utopia é indispensável perceber que aquelas áreas podem gerar receitas muito significativas a jusante. Como é o caso do turismo que dependerá para o seu pleno sucesso, cada vez mais, do ambiente e dos recursos naturais. Relação e dependência que, a nosso ver, implica um casamento perfeito!

Embora tratando-se de um sector económico que, teoricamente, deveria estar no âmbito de uma secretaria da economia, o turismo tem, e cada vez terá mais, uma importância que lhe confere a necessidade de ter uma grande autonomia e de estar organicamente ligado ao ambiente. Não deve continuar a ser apenas mais uma área debaixo do grande guarda chuva da economia.

Há anos o PSD encetou uma relação entre turismo e ambiente tendo criado a Secretaria Regional do Turismo e Ambiente. Embora tendo percebido a relação natural entre os dois sectores subalternizou o ambiente ao turismo dando àquele um caracter subsidiário e de segunda linha. Mas entendeu, contudo, essa ligação atribuindo ao sector do turismo uma importância de grande relevância. Faltou-lhe perceber que ao leme devia estar o Ambiente.

Constatações que, a nosso ver, fundamentam a necessidade imperiosa da criação da Secretaria Regional do Ambiente e Turismo.

Criação que irá unir, institucionalmente, dois sectores que estão efectivamente ligados por uma espécie de cordão umbilical, mas dando ao Ambiente a relevância que ele terá que ter de modo a poder assegurar uma política de turismo de sucesso. A inclusão do Turismo no Ambiente irá trazer a este uma importância decisiva no plano económico e àquele uma sensibilidade e um rigor decisivos para a sua sustentabilidade. Embora podendo parecer uma união heterodoxa trata-se de uma simbiose eventualmente perfeita embora, talvez, não politicamente correcta.

Sendo mais caros em termos de acesso que os nossos concorrentes directos (Madeira e Canárias), não oferecendo uma hotelaria e uma organização turística com os mesmos níveis de profissionalismo, não sendo um destino de sol e praia teremos necessariamente, que oferecer alguma mais valia que nos diferencie e justifique os preços mais elevados. Mais valia e diferença que, apenas, poderão ser encontrados na qualidade superior do nosso ambiente e dos recursos naturais. E esses patamares de qualidade, único passaporte válido para um futuro promissor, só poderão ser atingidos com uma política de plena integração entre ambiente e turismo. Resposta que, apenas, a nova secretaria poderá assegurar. Assim não sendo será o continuar doloroso da política das capelinhas, com sectores fundamentais de costas, uns para os outros.

Secretaria que deverá ter como responsável alguém com o indispensável peso político para poder impor medidas eminentemente transversais que afectarão toda a actividade governativa e que consiga fazer a síntese entre a consistência ideológica e de convicções de que o Ambiente necessita e o sentido pragmático e criativo que o Turismo impõe. Secretaria que consiga tirar os Açores da cauda do investimento no Ambiente a nível nacional, como aconteceu na última década!... Se assim não for arriscamo-nos a ter um Ambiente olhado de soslaio por quem quer, apenas, o lucro fácil e rápido e um Turismo contestado por quem luta por um desenvolvimento sustentável e pela qualidade de vida.

Tudo isto numa perspectiva, moderna e inovadora, que responda aos desafios e necessidade de um mundo incerto e inseguro que procura, cada vez mais, a paz e a tranquilidade aonde ainda são possíveis. Um verdadeiro desafio para os partidos que irão disputar as próximas eleições e para os políticos que aspiram dirigir os nossos destinos.

P E D R O D A M A S C E N O