sexta-feira, novembro 23, 2007

O destempero saudável do Rei de Espanha

O destempero saudável do Rei de Espanha


A perda de “compostura” do Rei de Espanha, na última cimeira ibero-americana, que o levou a sugerir ao Presidente Chavez da Venezuela que se calasse é um daqueles episódios – aparentemente menores – da grande política que vale a pena analisar.

Quase sempre a diplomacia clássica leva, em nome de interesses invariavelmente económicos, governos e nações a engolir verdadeiros sapos. Foi assim quando da vinda do Dalai Lama a Portugal e será assim com a vinda a Lisboa do facínora Robert Mugabe.

Apenas para falar em casos muito actuais. Mas a lista em que os princípios e as convicções foram postos de lado, em nome de um qualquer pragmatismo, é interminável e mais velha do que a Salve-Rainha!

Sem questionar que Hugo Chavez tenha algum mérito é indiscutível que encarna, na perfeição, o líder terceiro-mundista e sul-americano de discursos de horas e de um populismo radical totalmente avesso à democracia como a conhecemos. Um aliado natural de Fidel Castro, seu mentor e ídolo.

Para não falar, obviamente, numa lamentável falta das mais elementares noções de educação, convivência civilizada e respeito pelos outros.

A América do Sul é uma área com enormes carências que sofreu e continua sofrer na pele a ganância do seu grande vizinho do norte e da própria Europa e para a qual o mundo democrático terá que olhar, forçosamente, com outros olhos, numa perspectiva de cooperação verdadeiramente positiva.

Aznar é um político de direita e um dos membros do grupo que apoiou George W. Bush na invasão do Iraque e que fez parte da fotografia em família tirada na base das Lajes. Mas um político democraticamente eleito e que aceitou, também democraticamente, a sua derrota e a passagem de testemunho.

Goste-se ou não de Aznar, e eu não gosto especialmente, nada no seu trajecto permite identificá-lo como um fascista. Apenas um político de direita que desempenhou um papel importante no desenvolvimento da Espanha mas que não tentou por via de qualquer manobra parlamentar ou de rua perpetuar-se no poder.

De modo que é, liminarmente, ridículo que seja um homem com o perfil de Chavez que o venha apelidar de fascista sobretudo pelo sítio aonde tal foi feito e pelo carácter pejorativo e insultuoso da afirmação, ainda por cima, proferida repetidamente.

Estava-se numa cimeira de muitos países em que o mínimo denominador comum tem de ser o respeito institucional. Doutro modo poderíamos ter tido Zapatero a chamar-lhe a ele comuna e trauliteiro de meia tigela!...

O rei vai nu e toda a gente vê isso mas ninguém diz nada porque, afinal de contas, a Venezuela tem das maiores jazidas de petróleo do mundo e o próprio Chavez passa a vida a fazer chantagem com isso já tendo falado no barril de petróleo a 200 dólares.

De modo que o destempero do Rei de Espanha foi bem saudável: esqueceu-se, por momentos, da sua realeza e saiu-lhe uma reacção humana e autêntica. O que sendo tão pouco habitual nos políticos lhe valeu um enorme apoio popular.

No fundo as pessoas apreciam a autenticidade e a coragem cívica que Juan Carlos teve. Bem-haja.


P E D R O D A M A S C E N O

sexta-feira, novembro 09, 2007

AÇORES - uma pérola que pode virar pedra

AÇORES
Uma pérola que pode virar pedra


A conceituada revista americana National Geographic Traveller Magazine no seu número de Novembro/Dezembro 2007 reuniu um painel de 522 especialistas em turismo e destinos de qualidade para avaliar uma selecção de 111 ilhas e arquipélagos.

A pressão turística exagerada e, também, o esforço em encontrar o equilíbrio para não prejudicar a natureza e as populações locais foram os principais pontos analisados.
Na assunção de que o turismo é um fenómeno que tanto pode cozinhar a nossa comida como pode queimar a nossa casa. Ou, por outras palavras, o turismo tanto pode ser uma fonte de desenvolvimento como pode destruir os lugares que mais amamos.

Os Açores ficaram em segundo lugar com 84 pontos na lista elaborada por esse painel, apenas ultrapassados pelas ilhas Faroe na Dinamarca! Tendo a Madeira ficado num modesto 69º lugar com apenas 61 pontos.

Um resultado, a todos os títulos impressionante, e que coloca novamente os Açores nas atenções do mundo. Tendo sido escrito que os Açores, remotos e temperados, ainda são um local pouco turístico e maravilhoso se não se tornar num destino de massas.

E também que o ecossistema do arquipélago está em grande forma. As baleias são ainda uma visão comum. A cultura local é forte e vibrante. É comum ser convidado para a casa das pessoas para jantar, ou ser recebido com uma refeição comunal durante um festival.

Da Madeira disseram que apesar da reputação como um local de turismo de alta qualidade, jardins bonitos e um cenário paradisíaco para passeios, a Ilha tem sofrido com o desenvolvimento de hotéis para massas que se espalham a partir do Funchal. Sendo esses hotéis altos um ponto negativo dado que não se integram na paisagem e são demasiado dominantes.

Evidentemente que nós, açorianos, podemos estar contentes com a posição alcançada pela nossa Região e lamentar, por outro lado, que a Madeira – com todo o esforço de investimento que lá tem sido feito – tenha ficado numa fasquia bem mais abaixo.

Mas – e isto é o principal – o que importa é tirar as devidas ilações de tudo isto.

Os Açores ficaram em tal posição não tanto pelo que tem sido feito em matéria de turismo mas pela baixa densidade turística que cá se vive e pela qualidade ambiental da nossa natureza que ainda não sofreu o impacto de um crescimento hoteleiro desenfreado.

A Madeira ficou no lugar em que ficou não porque não tenha também belezas naturais ímpares mas porque justamente tem sido alvo desse crescimento turístico e hoteleiro desenfreado que a tem descaracterizado.

Ilhas, melhor que qualquer outro tipo de destino, simbolizam e apelam a férias. A sua insularidade torna-as mais atractivas do que qualquer outra área continental já que são mundos em si mesmo, com as suas tradições, ecossistemas, culturas e paisagens.

Mas aquilo que as torna únicas – o serem micro-mundos – torna-as, também, mais vulneráveis às pressões demográficas e, sobretudo, sensíveis a um turismo de massas que, inevitavelmente, as descaracteriza e lhes retira a sua magia própria.

Por conseguinte o desenvolvimento turístico dos Açores terá que ser feito com todos os cuidados ambientais e tipológicos respeitando integralmente as nossas escala e identidade sem esquecer a lição dos erros dos outros.

O nosso arquipélago é, comprovadamente, uma pérola que está a ganhar progressiva notoriedade internacional mas que poderá virar pedra como outras já viraram se não soubermos ler os sinais dos tempos e acatar as exigências de um mercado altamente competitivo e selectivo.



P E D R O D A M A S C E N O