sexta-feira, janeiro 27, 2012

TERCEIRO ACTO

O homem não deixa de brincar porque envelhece, envelhece porque deixa de brincar



TERCEIRO ACTO


A estrutura fabulosa que é o nosso cérebro não deixa de nos pregar partidas. Sendo, talvez, a maior aquela que consiste em automatizar a nossa vida ao ponto de tornar verdades aquilo que são apenas hábitos adquiridos.

A rotina, dia após dia, acaba por criar no cérebro circuitos de células que se transformam em verdadeiros programas que comandam as nossas vidas. E basta deixarmos que isso aconteça para nos transformarmos em quase robots.

Sendo isso verdade para as tarefas quotidianas (comer, conduzir, falar etc) também o é para as ideias feitas que, muitas vezes, temos sobre o mundo e a nossa existência: os nossos paradigmas ou modelos.

E um dos paradigmas mais assentes é o da terceira idade. Numa faixa etária que nebulosamente se coloca na casa do sessenta as pessoas entrariam na terceira idade que, eufemisticamente, significaria velhice.

Daí que episódios que acontecem a cidadãos a partir daquela idade sejam, por exemplo, referidos nos jornais como acontecendo a sexagenários ou septuagenários ou idosos o mesmo não acontecendo a trintões ou quarentões !...

O paradigma da existência de uma terceira idade baseia-se ainda numa realidade que há muito tempo deixou de o ser nas sociedade ocidentais em que a esperança de vida ao nascer aumentou quase trinta anos.

A própria idade de 65 anos foi aceite como a idade da reforma numa altura em que a esperança de vida ao nascer e os recursos médicos eram completamente diferentes.

De resto há profissões em que a “reforma” não tem nada a ver com idade avançada mas simplesmente com a capacidade física para desempenhar certas funções sendo exemplos claros os jogadores de futebol ou os pilotos de fórmula um.

Idade e doença não andam necessariamente de mãos dadas. Ser mais velho não significa linearmente ser mais doente nem ser novo significa ser mais saudável. Naturalmente que a idade acarreta alterações desde o nascer até ao morrer mas não há calendários predefinidos nem idade para morrer.

Cada caso é um caso.

Por tudo isso faz mais sentido referir esses trinta anos anos a mais de longevidade que conseguimos no século passado como o terceiro acto da nossa vida – o acto em que, em vez de descermos ás cavernas da decrepitude, encetamos a subida da escada da maturidade e da sabedoria.

Se aos sessenta anos faltam as pernas para jogar futebol certamente que aos vinte falta o cérebro para gerir a vida de forma plena e sábia. A energia telúrica e “inesgotável” do nascimento vai dando lugar à sua gestão inteligente.

Não sendo, ainda hoje, possível determinar, em termos científicos, a longevidade teórica máxima do ser vivo. Sendo da admitir que a eliminação de grande número das causas genéticas de morte e as terapêuticas estaminais permitam prolongar, com qualidade, o horizonte de longevidade para metas impensáveis.

O actual paradigma/modelo da idade está totalmente ultrapassado e nenhuma sociedade se pode dar ao luxo de desperdiçar recursos altamente sofisticados nem ninguém se pode dar ao luxo de não viver só porque envelhece.

A vida é uma arte que não conhece idade.



PEDRO DAMASCENO

sexta-feira, janeiro 06, 2012

As partículas de Higgs e tudo o resto

A ciência está mais perto de confirmar a existência da partícula, considerada
crucial para a compreensão da formação do Universo
BBC



As partículas de Higgs
e tudo o resto


A possibilidade da existência de umas ultra minúsculas partículas que têm (terão) o nome do cientista Peter Higgs, seu mentor, tem excitado o mundo científico tendo alguém já se atrevido a chamar-lhes as partículas de Deus.

Isto porque, a confirmar-se cientificamente a sua existência, explicariam o aparecimento da massa e de todos nós dispensando, porventura, a existência de um Deus, criador e todo-poderoso.

Enfim jogos super sofisticados neste nosso mundo aonde milhões de pessoas ainda são analfabetas e outras tantas iliteratas. Neste mundo conturbado aonde se continua a morrer por motivos confessionais, em nome de Deus.

Coisas nas antípodas umas das outras tanto quanto as desigualdades sociais que ainda atormentam países como os Estados Unidos e nós próprios – o país europeu em que essas desigualdades são maiores.

Enquanto cientistas “perseguem” as presumíveis partículas artífices do Universo num sofisticado e imenso acelerador das mesmas na Suíça nós por cá vamos prosseguindo o nosso Fado, agora transformado em Património Mundial.

Tão perto e tão longe daqueles laboratórios, capazes de feitos científicos tão elaborados, continuamos, nesta leira a beira mar plantada, as escuras sem conseguir encontrar uma saída para uma situação que foi apelidada de crise e que virou tema de toda a comunicação social, de manha ate a noite.

Como se a "crise" fosse simplesmente uma enigmática palavra chave encontrada para desculpabilizar, justificar e adiar. Palavra que de tanto e tão levianamente ser utilizada se desbotou e esgotou tornando-se apenas num lugar comum que quer dizer tudo e não diz nada.

Portugal vive uma conjectura difícil que há muito se adivinhava e que implodiu em virtude de terem falhado os amortecedores, leia-se Europa, que sustentavam um modo de vida sem sustentabilidade como os factos comprovaram.

O resto deveria ser uma mobilização geral das pessoas para agarrarem o boi pelos cornos e se empenharem numa mudança de vida apoiada numa tomada de medidas estruturais e estruturantes e estimulada por um discurso de combate e optimismo.

Não um zurzir na desgraça, continuo e generalizado, um muro das lamentações que se estende de norte a sul e que só aumenta a espiral de descrença e cepticismo inibindo a energia necessária para acreditarmos nos nossos recursos e capacidades de-lapidando, ainda mais, os que já pouco tínhamos.

O Pais precisa de lideres carismáticos que não se limitem a falar e a falar sem dizerem nada e muito menos de meros executores de falências antecipadas. Os compromissos e as dividas são para honrar mas terá que haver muito mais do que isso.

Terá que haver apuro de responsabilidades e avaliação dos defeitos estruturais que permitam traçar um rumo claro que terá de passar pela dignificação da politica, dos políticos e da vida publica em geral. Um rumo e uma estratégia que terão de ser exaustivamente explicados ate se tornarem numa verdadeira causa nacional e num factor de coesão.

Uma estratégia que crie riqueza e não apenas ricos, como bem disse Mia Couto. Um rumo que corrija as desigualdades e estimule a igualdade de oportunidades repondo a criatividade, o trabalho e o mérito como pilares do Pais.

Foi isso que fez a Islândia. É isso que teremos de fazer.



P E D R O D A M A S C E N O