domingo, agosto 30, 1992

A ESTRATÉGIA DA ROLETA RUSSA


FACE OCULTA

                                                                                                          «Roleta. f. Jogo de azar.»



A ESTRATÉGIA DA ROLETA RUSSA



Ao colocar, à partida, nas mãos do Dr. Mário Machado o cargo político regional mais importante, o Partido Socialista tornou-se, antecipadamente, em seu refém absoluto.

Se o PS ganhar as eleições, o actual Presidente da Câmara Municipal de Ponta Delgada será o próximo presidente do governo.

Nem mais nem menos.

Assim, um praticamente ilustre desconhecido da política regional «arrisca-se» a ocupar um lugar da maior relevância. Aparte um curto desempenho de funções autárquicas, ainda que no maior município açoriano, umas entrevistas na RTP/Açores e uns bons índices, segundo se diz, em sondagens encomendadas pelo PS pouco mais se sabe do Dr. Mário Machado.

Sem pretender desqualificar o cidadão, que como qualquer outro deve merecer todo o nosso respeito, é indiscutível que se trata de um curriculum político muito pobre para o desempenho de funções que exigem grande e comprovada experiência, bom conhecimento dos dossiers regionais, capacidade negocial e de estabelecer consensos e, acima de tudo, capacidade de liderança de um estado democrático.

Não faz nenhum sentido que o Partido Socialista tenha travado durante todos estes anos um prolongado e árduo combate político como maior partido de oposição e em que, tantos e tão capazes, militantes se empenharam para entregar, de mão beijada, o poder a um desconhecido que, ainda por cima, nem socialista é.

O único sentido que se pode descortinar em tal estratégia é o desespero de finalmente chegar ao poder, seja a que preço for. Nem que para isso tenha tido que sacrificar os seus princípios programáticos, a sua democracia interna, a dignidade do seu líder e os legítimos direitos de militantes com provas dadas.

Será, assim, tão importante assim para o relançamento da imagem do Eng. António Guterres e do PS nacional uma vitória (?) do partido dos Açores?

Por muito simpático, populista e bom gestor que seja, o Dr. Mário Machado é uma perfeita incógnita para os açorianos em geral e socialistas em particular. E não será a sua peregrinação pelas ilhas nem a campanha eleitoral que o irão dar a conhecer. Porque propaganda não passa de propaganda.

Com base nos dados que se dispõe, o candidato a presidente do governo regional proposto pelo PS tanto pode vir a ser bom, assim-assim ou mau como, muito mau. Será mais uma questão de fé, amor à camisola ou, então de voto útil.

Porque não se sabe se é o Partido Socialista que está a reboque do Dr. Mário Machado ou se é este que anda a reboque do PS. Mas pelo que se tem ouvido nas declarações do candidato, pela composição de alguma listas e por histórias de Ponta Delgada, o mais provável é que seja o PS que anda a reboque do Dr. Mário Machado.

Até pode ser que haja um acordo secreto, escrito em tabelião e tudo, que dê ao PS todas as garantias que o seu candidato vai ser, na prática, um zeloso governante ao serviço do partido que o elegeu  do socialismo democrático. Mas se há, os eleitores não o conhecem e, portanto, terão de se limitar a acreditar nas declarações de boas intenções.

Ao apostar nesta estratégia o PS apostou no tudo ou nada: se ganhar vai ficar com um sarilho, de todo o tamanho, nos braços mas sempre poderá inebriar-se com a tão desejada vitória e esperar que o exercício do poder lhe dê uma oportunidade para pôr a casa em ordem; se perder vai ficar em cacos.

 Ao puxar o gatilho o partido Socialista não sabe se tem alguma bala na câmara ou não. Uma verdadeira estratégia de roleta russa.



P E D R O  D A M A S C E N O


Nota: O último «FACE OCULTA» intitulado «AD – Açores: um arremedo de «Sá Carneiro» regional?» trouxe um parágrafo com uma gralha que lhe alterou o sentido, deveria ler-se assim: «Será difícil que alguém venha a acreditar na validade política de uma proposta que pretende ser um frentismo anti – Mota Amaral, mas que tem no seu interior o vírus da sua própria doença. Seria como tratar um doente com Sida dando-lhe transfusões com sangue infectado com a doença.»
O nosso colaborador Pedro Damasceno não tem qualquer suspeita de que a AD – Açores tenha Sida!
As desculpas aos nossos leitores e à AD – Açores.

sábado, agosto 15, 1992

AD-AÇORES: arremedo de "SÁ CARNEIRO" regional?


FACE OCULTA



«Um aliado tem de ser vigiado da mesma maneira que um inimigo»
                                                                                                      Leon Trostky



AD-AÇORES: ARREMEDO DE «SÁ CARNEIRO» REGIONAL



As coincidências são mais do que muitas para não passarem apenas disso. Até o PPM, partido que nunca teve qualquer expressão na Região, foram buscar.

Contudo há, também, diferenças consideráveis que podem tornar a AD – Açores numa imitação, de duvidosa qualidade. Para além do indiscutível mérito de ser mais uma força política a oferecer os seus préstimos ao eleitorado açoriano, poderá haver dúvidas legítimas quanto ao seu futuro desempenho na política regional.

Desde logo porque tem como matriz o CDS, partido que sempre tem tido prestações eleitorais muito baixas. De seguida porque como uma força que tem essencialmente como referência a ilha Terceira, facto que lhe retira, uma base regional de apoio.

Mas as dificuldades não ficam por aí. É uma força que procura colher votos no eleitorado PSD, mas excluindo este partido. Ou seja vai buscar dissidentes deste partido pra funcionarem como «a peninha no chapéu». Trata-se, portanto, de uma AD sem PDS, mas a fingir que o tem.

Naturalmente que quando escolheram o nome AD – Açores, os seus mentores não o fizeram por mero acaso mas por motivos políticos e que seriam, mutatis mutandi, os da AD de Sá Carneiro, contudo o que a AD – Açores pretende não é, evidentemente, a constituição de um bloco de centro direita para vencer a esquerda liderada para vencer o Partido Socialista. Mas quase o contrário: ajudar aquele partido a derrubar o PSD. Circunstância que torna a escolha do nome difícil de perceber, a menos que se esteja perante uma perfeita demagogia destinada a capitalizar o saudosismo de certas camadas de eleitores sociais-democratas.

A AD – Açores mostra-se determinada a participar no derrube de Mota Amaral, mas propõe-se conseguir esse objectivo usando, até ao pormenor, num modelo conhecido para derrubar o PS e a esquerda. Determinação esta que levou mesmo a que o CDS cedesse a liderança desse dissidente de última hora do PSD e, ainda por cima, uma ex-figura de proa do estado laranja regional que essa mesma AD pretende derrubar!

É o que, com propriedade, poderíamos designar de «tratar o bicho com o pelo do mesmo animal»!

Se a AD – Açores o inimigo número um é o PSD/Mota Amaral porque não se coligou o CDS com o PS em torno da candidatura de Mário Machado? Porque se refugiou atrás de argumentos de ordem ética e correu a servir de base de apoio aos novos políticos de um dos grandes responsáveis pela actual situação política regional?

Será difícil que alguém venha a acreditar na validade política de uma proposta que pretende ser um frentismo anti- Mota Amaral, mas que tem no seu interior o vírus da doença da Sida, dando-lhes transfusões de sangue infectado com a doença.

O CDS pese, embora, a pequenez do seu grupo parlamentar na Assembleia Legislativa Regional deu contributos muito válidos quer para a melhoria do funcionamento daquele órgão quer para a vida política regional. Como também é sabido o CDS conta, entre os seus militantes, com quadros técnicos de valor reconhecido a que, inclusive, abriram e abrem o apetite do PS e de Mário Machado.

Porquê, então, a estratégia seguida? Será sina dos partidos da oposição regional, hipotecarem os seus líderes e dirigentes máximos e os seus princípios a hipotéticos ganhos eleitorais?

Será que o CDS acredita que poderá vir a desempenhar um papel de partido charneira na próxima assembleia, preparando-se para negociar o poder com um PDS enfraquecido e sem maioria absoluta? Ou será que não tendo, pudicamente, querido entrar na «nave» Mário Machado, se prepara para o obrigar a baixar a bola, eventualidade de ele ter de formar um governo de coligação?

E quanto ao cabeça de cartaz da AD – Açores?

Não discutimos as razões do Dr. Borges de Carvalho porque essas são óbvias. Só não percebe quem não quiser.

Fica-nos, apenas, a dúvida de qual é o seu objectivo final: simplesmente manter um lugar ao sol na política regional ou um regresso triunfal a um PSD, órfão, desorientado e vergado pela derrota?

AD – Açores: arremedo de «Sá Carneiro» regional?



P E D R O  D A M A S C E N O