sexta-feira, janeiro 28, 2011

Em busca da alma perdida

Muda primeiro em ti o que queres mudar no mundo
Ghandi


Em busca da alma perdida


Portugal, muito antiga e nobre nação, tem tudo para dar certo: clima, paisagem, grande área de mar, regiões autónomas marítimas. E sobretudo o povo, afável e capaz de grandes feitos como a História nos ensina.

Nos últimos cem anos chegámos a ser a nação que mais cresceu economicamente na Europa. Para não falar, naturalmente, nos mundos que demos ao mundo e nas marcas que deixámos um pouco por todo lado.

Somos capazes e muito viáveis como sobejamente já provamos durante a longa marcha que trazemos desde os tempos do Condado Portucalense.

E, contudo, andamos agora nas bocas do mundo como um pais à beira da falência e o nosso dia-a-dia só nos fala de crise e de falta de dinheiro, curvados perante os canhões em posição do FMI!

Depois da queda do cinzento, austero e miserabilista regime salazarista conquistámos, de novo, o direito à democracia e à participação política que nos tinha sido arrancada como consequência dos desmandos republicanos de outrem.

Entramos na Europa saindo, finalmente, de dezenas de anos do isolamento do “orgulhosamente sós” a que o dito estado novo nos tinha acorrentado na tese de que para lá de Vilar Formoso estava o pecado e a perdição.

Com olhos no bem estar europeu começamos a usufruir das benesses das liberdade e dos sólidos apoios económicos a que tivemos acesso. Sentimos-nos europeus, fundamos partidos e fomos à vida.

Passados quase quarenta anos desde a restauração da democracia baixamos a cabeça e nem sequer ao trabalho de votar nos damos. Deixamos de acreditar na política e nos políticos que, nós próprios, criámos.

A abstenção cresce para níveis preocupantes, a corrupção e o compadrio alastram e, tudo indica, que voltámos ao estado de espírito abúlico e desiludido de que tem já não acredita em nada e deixou cair os braços.

Quando o que se passa hoje em dia – e é muito mau – é da nossa responsabilidade colectiva. Temos os políticos e os partidos que ajudámos a criar e a filosofia de vida que escolhemos.

Só temos, portanto, que nos virar para nós próprios.

Só temos, cada um de nós, de mudar aquilo que achamos mal nos outros. Deixando de lado a convicção infantil de que as coisas estão mal por razões e pessoas alheias e que, individualmente considerados, somos todos óptimos.

As eleições presidenciais, mornas e sem rasgo, vieram mostrar um país que fortemente se absteve (que não está para se chatear..) mas mostrou, também, um país que foi as às urnas para dizer não ao sistema expressando vontade de participação cívica.

Temos o sistema que, colectivamente, fomos capazes de gerar. Os indispensáveis partidos e políticos que temos foram criados à nossa imagem e semelhança. Se não gostamos do resultado só temos que nos mudar a nós próprios e o resto vira por acréscimo.

Não esperando por qualquer salvador milagroso que nos venha fazer o trabalho de casa para, depois, nos por, de novo, açaime. Como diria um conhecido comentarista da praça: não há pequenos almoços de graça!...


P E D R O D A M A S C E N O

sexta-feira, janeiro 14, 2011

Bastão e Cenoura?

Quanto mais leis mais ladrões
Ditado taoísta


Bastão e Cenoura?


A crise das instituições em Portugal já se tornou um facto banal, de tanto ser badalado. Sobretudo a administração pública que, de forma recorrente, ocupa o pódio da baixa rentabilidade e o centro do humor laboral.

E também, de forma recorrente, se preconiza como solução a nomeação de comissões de inquérito que, por sua vez, apontam para a emissão de mais regras, regulamentos e leis. Bem como a instituição de incentivos para os vários agentes fazerem bem aquilo que era sua obrigação.

Bastão e cenoura.

E, assim, vamos perdendo a confiança em instituições de que dependemos. Instituições que não nos dão o que precisamos.

Escolas que não cuidam da instrução dos nossos filhos como deviam. Médicos que não nos dão a atenção e os cuidados sem pressas que procuramos. Sistema judicial mais amarrado a procedimentos administrativos do que a fazer justiça.

Funcionários administrativos das mil e uma repartições que nem se preocupam em dar bom dia e utilizam o seu “poder” de forma displicente e arrogante. Trabalhadores do estado que adormecem em cima das enxadas.

Todos nós conhecemos e vivemos isto. Como, também, todos nos sentimos desencantados e insatisfeitos. Mas, bem mais frequentemente do que se pensa, os autores dessas nossas frustrações também estão, por sua vez, mergulhados no desencanto e na frustração.

Muitos médicos gostariam, certamente, de tratar bem melhor os seus doentes em vez de estarem afogados em tarefas administrativas e terem de atingir verdadeiros recordes de consultas por hora.

Muitos professores gostariam de ensinar melhor o seus alunos em vez de estarem absorvidos por intermináveis acções de formação, testes estandardizados e novas técnicas de ensino que, na prática, se traduzem num interminável aumento de tarefas burocráticas.

Muitos magistrados, advogados e funcionários judiciais estariam muito mais realizados se não estivessem soterrados sob verdadeiras diarreias legislativas e regulamentares mas, antes, a fazer justiça.

Muitos funcionários administrativos estariam muito mais satisfeitos a fazer tarefas simples e claras que tornassem o seu trabalho atractivo do que sujeitos ao infernal aparelho burocrático do estado.

No fundo a grande maioria de todos nós gostaria que o nosso trabalho fosse estimulante e gratificante. Do mesmo que todos nós sentimos necessidade de afecto e calor, quer a nível pessoal quer a nível profissional.

Trabalho e afecto: as chaves da felicidade.

E para isso é indispensável a sabedoria prática, a mesma que um tocador de jazz precisa para improvisar ou um artesão para fazer uma casa.

Sabedoria não é um bem reservado a elites e a gurus mas uma ferramenta essencial à gestão do nosso dia a dia. Uma sabedoria prática que nos ajude a atingir a excelência na vida e a saber lidar com os problemas concretos. Uma sabedoria que os antigos tinham de sobra.

Regras e incentivos são necessários. Mas nada pode substituir o olhar para dentro e o saber libertar o enorme potencial que todos nós possuímos. Trocando as voltas ao circo mediático e barulhento em que se tornaram as nossas vidas.

Uma tarefa que cabe a todos: desde o primeiro ministro ao mais modesto trabalhador.


P E D R O D A M A S C E N O