sexta-feira, fevereiro 13, 2009

A teologia dos autocarros

Deus existe? Em Madrid, isso depende do autocarro!
Nuno Ribeiro (Público)




A teologia dos autocarros


Madrid ameaça tornar-se no epicentro de uma verdadeira erupção teológica! Erupção que surge em forma de cartazes de publicidade colocados em oito autocarros de cinco linhas daquela cidade.

Em publicidade paga seis desses autocarros defendem a existência de Deus enquanto dois defendem o oposto. Todos eles com slogans alusivos: “Deus Existe”; “Provavelmente Deus não existe. Deixas as preocupações para trás e goza a vida”; “Quando todos te abandonam, Deus fica a teu lado”.

Todos eles da maior profundidade e que vêm repor a teologia como matéria nobre das horas de ponta da movimentada cidade espanhola. Podendo os cidadãos, entre a leitura apressada do jornal e as secas de espera nas paragens, aprofundar a sua espiritualidade.

Quiçá mesmo discernir finalmente, por entre anúncios de detergentes e perfumes lascivos, o significado supremo da vida. Se podemos, por exemplo, gozar a vida porque Deus não existe ou se não nos devemos preocupar com nada porque Ele existe e não nos deixa sozinhos.

A campanha começou em Londres por iniciativa da British Humanist Association do Reino Unido e estendeu-se a Espanha prometendo chegar a Sevilha, Valência, Saragoça e Bilbau. E porque não Lisboa, Porto, Coimbra e Faro?

Uma espécie de teologia do povo aligeirada ao estilo de fast-food espiritual. Para quê entrar em horrendas discussões académicas ou tentar ler livros chatíssimos como a Bíblia ou o Alcorão que nos põem a dormir em dois tempos?

Quando a coisa é bem mais simples: deixar de acreditar em Deus para gozar ou então simplesmente acreditar em Deus para ser feliz. Elementar.


Sendo estas questões assim simples porque não tornar os autocarros de Madrid – e mesmo do mundo – no fórum ideal para a discussão da existência ou não de Deus. Poupa-se balúrdios em peregrinações, templos, ordenados e velas.

E Deus, se existe, deve estar algures no Paraíso, morto de riso. Porque tendo-nos feito, à Sua imagem e semelhança, não resistiu a dotar-nos de uma pitada de sentido de humor que agora rende boas gargalhadas. Se não existe teremos que nos rir por conta própria.

E, claro, escolher entre se existe Deus ou não existe terá a ver com a qualidade visual e estética dos anúncios, com as cores com o lettering, etc. E porque não, no futuro, com mulheres boas nuas? Se servem para vender tudo, desde a carros a electrodomésticos, também podem servir para vender umas Sodomas e Gomorras modernas ou a castidade envolta em hard-rock.

A opção é nossa mas, no fundo, tanto faz. A felicidade/gozo está certa, com ou sem Deus. Uns porque sim e os outros porque não.

Resta-nos a consolação (pelo menos nesta parte do mundo) de poder escrever jocosamente sobre tudo isso sem termos de enfrentar amanha uma manifestação ululante de desagravo ou uma sentença de morte, decretada à revelia.

Está tudo, garantidamente, doido.


P E D R O D A M A S C E N O

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