segunda-feira, junho 15, 1992

O FAX DO MEU DESCONTENTAMENTO


FACE OCULTA



O FAX DO MEU DESCONTENTAMENTO



Nada como um exemplo concreto para elucidar um ponto de vista, uma perspectiva. 

Tantas vezes, bater e rebater num assunto sem dar exemplos, provas concretas, acaba por não dar em nada. Acaba por perder força, por muita razão que exista.

É ponto assente que as nossas telecomunicações são péssimas. Toda a gente se queixa: das horas perdidas para obter ligações telefónicas, das chamadas que sistematicamente vão dar números completamente diferentes, de linhas cruzadas, das contas exorbitantes, da falta de educação e de profissionalismo dos serviços de informação e apoio, dos anos de espera para obter um simples telefone, etc.,etc..

Situação que atinge proporções verdadeiramente preocupantes em regiões insulares como a nossa. Não só pelas distâncias que nos separam de ilha para ilha mas também das que nos separam do exterior. Tudo isso numa época em que as telecomunicações conhecem uma importância crucial: telefone, telex, fax, modem, videoconferência.

A falta de tempo é, talvez infelizmente, um dado, cada vez mais presente, na vida moderna. Quem pode perder horas a fio para a obtenção de uma simples ligação telefónica? Como contabilizar os custos dos contactos, da mais variada ordem, que não se concretizam?

São custos humanos e económicos que constituem um verdadeiro estrangulamento ao nosso desenvolvimento e um grande peso no nosso isolamento. Um flagelo com que temos que nos debate diariamente.

Contudo nunca se viu qualquer responsável pelas telecomunicações – que continuam a ser monopólio, a nível nacional e europeu, dos CTT – vir publicamente admitir este lamentável estado de coisas e se disponibilizar para a sua solução. Antes pelo contrário, só aparecem para se desculpar ou então para anunciar grandes investimentos que tardam em se traduzir em melhoras objectivas.

Porque o primeiro passo para a solução de um problema é saber e reconhecer que ele existe. Enquanto a administração dos CTT não admitir publicamente o estado verdadeiramente calamitoso das nossas telecomunicações não haverá condições para uma solução.

Entretanto toda a actividade económica regional sofre distorções acrescidas e dificuldades insuperáveis, desde as instituições financeiras aos agentes económicos em geral. Para além dos barcos que não existem ou dos portos que não servem e dos aviões que não aterram porque as pistas não têm tamanho ou porque não há planeamento adequado dos voos, ainda nos resta o tormento das comunicações.
Mas vamos ser concretos.

Na minha frente repousam comprovativos impressos de 10 (dez) tentativas que foram necessárias para mandar um fax do Pico para a Madeira. Sem contar com as inúmeras (mesmo «muito inúmeras») vezes que o aparelho de fax não conseguiu estabelecer ligação com a Madeira, estabeleceu nove ligações abortadas que contabilizaram 17 (dezassete) minutos durante 2 (dois) dias. Apenas à décima ligação efectuada foi passado o fax na sua totalidade, o que demorou 4 (quatro) minutos. Assim, para um fax de 4 minutos, foram gastos 21 para além do tempo, que foi muito, necessário que foi para operar a máquina embora esta tenha diapositivo automático de envio.

É evidente que para além do tempo e dinheiro gastos, este incidente criou grandes dissabores para quem estava dependente do malfadado fax.

Claro está que os 17 minutos de utilização de rede que foram desperdiçados e o tempo do operador foram integralmente suportados pelo utente que continua a ter que pagar sem bufar. Ou melhor, pode bufar, mas sem que isso adiante nada porque quem decide é quem prevarica e não me consta que ser juiz em causa própria tenha alguma vez conduzido à justiça.

O verdadeiro fax do meu descontentamento.



P E D R O  D A M A S C E N O

PS.: Até este fax para chegar à Madalena…sofreu…e passou pelo Cais do Pico.


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