quarta-feira, maio 17, 2006

Boa Gente

Portugal é o país europeu com maiores desigualdades sociais
Dos jornais



B O A G E N T E


Os portugueses são, indiscutivelmente, boa gente.

São afáveis, simpáticos e afectuosos. São capazes das maiores peixeiradas e barbaridades verbais que, normalmente, não concretizam esperando, antes, por uma oportunidade para caírem nos braços uns dos outros.

Gostam de ter muitos amigos e usam a palavra com a maior facilidade: uma pessoa amiga, somos muito amigos etc. Mas esse aparente culto da amizade é, muitas vezes, assente numa grande inconsistência.

São de lágrima fácil e de emotividade subcutânea – uns adeptos incondicionais do porreirismo, termo possivelmente inventado por portugueses. São uns gajos porreiros num país porreiro.

Gostam de comer e beber bem e não há festa, comemoração ou mesmo evento político que valha a pena sem comes nem bebes.

E a culinária portuguesa traduz isso mesmo: pesada e de longa digestão, a convidar a uma boa sesta depois de umas conversas porreiras temperadas por um bom rebatente.

Para não falar no almoço – uma verdadeira instituição nacional. Desculpe mas o senhor está almoçar, saiu para almoçar ou saiu para almoçar e ainda não voltou. Uma instituição intocável que tem agora a variante tecnocrática dos almoços de trabalho.

Gostam de discutir, guerrear e libertar adrenalina mas não gostam do confronto frontal e directo. Na altura da verdade quedam-se, geralmente, por paninhos quentes que não ofendam e não venham pôr em causa o porreirismo.

Por isso mesmo, apesar dos mais de trinta anos de democracia, a má-língua e a coscuvilhice continuam a ser dos jogos sociais mais praticados. Acontecendo aos mais variados níveis e atingindo transversalmente a sociedade portuguesa: desde o camponês ao ministro.


O advento dos partidos, das eleições e do poder assente no voto, tornou este na verdadeira moeda de troca da sociedade portuguesa. O escudo desapareceu mas o voto continua e é realmente o que conta, desde a autarquia local ao governo.

Há muito tempo que os portugueses gerem o seu voto em função daquilo que lhe parecem ser os seus interesses mais imediatos ou as eventuais vantagens que dele possam tirar. Disponíveis para todas as manobras de assédio interesseiro, disciplina em que os políticos (com honrosa excepções) se tornaram exímios.

Todos os portugueses acham que é fundamental fazer grandes reformas, mudar as mentalidades e investir na educação. Mas desde que seja apenas para o vizinho.

Não há português que não ache que isto vai mal e, quase todos, têm uma fórmula mágica que usariam se estivessem no lugar de quem manda. Fórmula que, por ironia, os que mandam parecem não ter…

Se alguém incauto aterrasse em Portugal e não soubesse que o país está em crise pensaria exactamente o contrário. Até, possivelmente, iria pensar que o números de desempregados está errado tal a displicência com que os empregados tratam os seus postos de trabalho.

Os mesmos portugueses que quando emigram até se tornam excelentes e cumpridores trabalhadores. Como tivesse sido suficiente terem, apenas, mudado de contexto social e cultural e não poderem depender, sómente, do votito e do porreirismo para sobreviverem.

Boa gente, os portugueses.





P E D R O D A M A S C E N O

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