sexta-feira, março 01, 2013

A pantomina das facturas


FACE OCULTA




A pantomina das facturas
 (quando o fraco se faz de forte)





A polémica instalada em Portugal sobre a obrigatoriedade do consumidor pedir facturas reflecte, exemplarmente, o estado de esquizofrenia legislativa e regulamentar em que se caiu.

O estado vendo-se incapaz, através do seu braço armado - o fisco -, de fiscalizar a actividade económica descobre o ovo de colombo: transformar, compulsivamente, o cidadão comum em bufo/fiscal.

Numa lógica do tipo não-mate-o-próximo-que-é-crime ou não-assalte-essa-casa-que-é-proibido. Transformando o cidadão num misto de polícia, fiscal e juiz. Transferindo, também, para ele o ónus da repressão/fiscalização e deixando para quem de direito apenas a tarefa de incomodar os já sobretaxados cidadãos (velhinhas e deficientes incluídos).

Não se questionando o princípio da fiscalização económica - legal e, já agora, ilegal - é absurdo (e possivelmente inconstitucional) tentar transferir para o cidadão tarefas tipicamente do estado e, ainda-por-cima, com a ameaça de multas - mais impostos travestidos?

Sobretudo quando as empresas, legais e sérias, se vêm confrontadas com um verdadeiro colete-de-forças informático e de cruzamento de dados que lhes acarretam custos suplementares para o exercício da sua actividade. Vendo, à sua volta, a proliferação de uma concorrência ilegal que se move relativamente à vontade.

A sobrecarga de impostos e a complexidade contabilística a que se chegou neste país torna rentável e apetecível a fuga ao fisco e o recurso à economia paralela. A ocasião faz o ladrão e este sabe bem que a nossa teia burocrática e judicial joga totalmente a seu favor. Os exemplos abundam e nem é preciso falar no inenarrável caso BPN nem nas corrupções ao mais alto nível.

Quanto mais leis mais ladrões.

Este é, seguramente, um caso em que o cidadão deverá tomar posição e manifestar - de forma bem enfática - o seu desacordo. Numa prática de cidadania que demonstre que a democracia não começa nem acaba em eleições/parlamento/governo. A democracia constrói-se no dia-a-dia e o cidadão deverá ser o actor principal.

Sem pretender diminuir a política e a legitimidade do voto mas chamando a atenção para que a democracia não é um mero exercício de opinião a fazer de quatro em quatro anos. Não podendo governo/maioria fazer simplesmente o que quer e lhe apetece nem o cidadão ultrapassar os limites da correcção/respeito.

O populismo e demagogia germinam bem em casas em que não há pão mas é difícil não perder a compostura perante a arrogância de quem devia dar o exemplo mas, antes, utiliza o poder político discricionariamente e sem a mínima preocupação de diálogo.

Portugal vive dias muito difíceis com um exército crescente de desempregados (uma negação do direito à vida, como diria Ortega y Gasset) e preocupantes níveis de pobreza. Portugal resmunga e protesta mas ainda sofre muito em silêncio.

Não é tempo para brincarmos aos polícias e ladrões.

  
P E D R O    D A M A S C E N O





Sem comentários: