quinta-feira, abril 30, 1992

A GUERRA DOS PAPOS-SECOS


FACE OCULTA



A «GUERRA» DOS PAPOS-SECOS



Por incrível que pareça, o Pico está privado, há meses, de um bem de consumo de 1ª linha: o papo-seco.

Um diferendo sobre o preço de venda ao público entre as padarias e o governo terá levado aquelas a deixarem, pura e simplesmente de fabricar o papo-seco. E pronto, sem apelo nem agravo, as pessoas que se virem e passem a comer outro tipo de pão!...

Os dias e meses passam e nada.

Enquanto nas outras ilhas (para não ir mais longe no próprio Faial) se continua a consumir o papo-seco, no Pico não. Porque as, pelos vistos, todo soberanas padarias decidiram que não estavam dispostas a fabricar o produto a não ser pelo prelo que entenderam ser o melhor que os convinha!

Perante a total passividade do governo, dos deputados, das autarquias e do próprio público em geral uma situação caricaturalmente anómala mantém-se. Numa parcela da Comunidade Europeia e numa ilha com pretensões a conquistar um espaço no difícil segmento alto do mercado europeu.

Abrenúncio!

Imagine-se apenas o ridículo de um turista solicitar um papo-seco num restaurante e responderem-lhe que não há, que as padarias decidiram não o fabricar e que o governo não se importa. Um verdadeiro «farwest» de mercado, sem regras nem fiscalização.

Será que se perdeu por completo o senso critico?

Imaginemos, por redução ao absurdo, que esta lógica de mercado se estende a outros sectores. Poderemos ter, por exemplo, os pescadores a venderem apenas cherne ou goraz porque lhes dá mais lucro, os talhantes a venderem apenas carne com osso e cortada a direito porque rende mais e dá menos «chatices», as farmácias a deixarem de vender os produtos com pequena margem de comercialização, os comerciantes a deixarem de vender farinha e açúcar a retalho porque não dá nada, etc., etc..

Naturalmente que a indústria de panificação tem, como qualquer outro parceiro social, direito a defender os seus pontos de vista e lutar pelos seus interesses. O que não se percebe é como podem, imponentemente, retirar do mercado produtos de consumo diário e generalizado como é o papo-seco. 

Faria sentido que fizessem uma suspensão simbólica do fabrico para marcarem uma posição. É abusivo e inteiramente absurdo que decidam, pura e simplesmente, deixar de fabricar um produto por tempo indeterminado. Ou será que a indústria da panificação não está regulamentada e que, se calhar, qualquer dia só podem comprar pães de cinco quilos que dão mais lucros e menos «Chatices» para os padeiros!

Que actue quem tem que actuar.

Trata-se, ao fim e ao cabo, de defender os interesses dos consumidores que não podem, num estado de direito e democrático, estar apenas dependentes dos interesses, mesmo que parcialmente legítimos, de qualquer indústria, seja ela de panificação ou outra.

Se assim não acontecer estaremos, mesmo, perante uma autêntica «guerra» dos papos-secos numa atlântica e europeia república das bananas.


P E D R O  D A M A S C E N O

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