quinta-feira, outubro 15, 1992

CASOS EXEMPLARES


FACE OCULTA


«A civilização é um movimento e não uma condição, uma viagem e não um porto»
                                                                                                                                Arnold Toynbee


CASOS EXEMPLARES


É praticamente um lugar-comum falar mas dos telefones e dos correios. Tal é a frustração que as contínuas incompetências, abusos e prepotências criam nos cidadãos.

Os correios e Telecomunicações de Portugal continuam a ser um grande elefante branco que, sobranceiramente, caminha sobre o nosso quotidiano insular.

As reclamações e críticas são de todo o lado, das mais variadas e, por vezes bem exaltadas. Mas tudo termina, invariavelmente, no cesto dos papéis da empresa. Raríssimas vezes esta se dignou dar esclarecimentos públicos e adequados. E, quando o fez, foi mais para publicitar os milhões que investiu e vai investir na Região.

Mas não adianta gritar e espernear. Haverá sempre uma desculpa e tudo ficará, habitualmente, na mesma.

As situações, hoje já clássicas, repetem-se diariamente: contas de telefone exorbitantes que os utentes têm de pagar sem qualquer possibilidade de controlo, telefones que funcionam aos soluços e quando do calha, anos de espera para um telefone, cartas que desapareceram misteriosamente ou que demoram meses a chegar aos destinatários, tarifas especiais (expresso e correio azul) que não cumprem os prazos anunciados, etc. etc..

Mas mesmo que o cidadão se sente e escreva uma queixa perfeitamente fundamentada não tem qualquer garantia de ter uma resposta escrita, atempada e satisfatória. Pode esperar, debalde, mais um ano sem que o assunto ande. Por muito gravoso que isso seja para a sua vida. O que pode é deixar de pagar o telefone na alturinha certa e por muito disparatada que seja a conta, aí a empresa é mesmo eficaz. Adeus viola!

Os CTT funcionam para o imaginário comum como quele criminoso que faz trinta por uma linha e que acaba sempre por escapar. Arranja sempre um expediente, uma desculpa, um silêncio e está feito.

Só que, talvez, desta vez a empresa terá que enfrentar um situação muito concreta e da qual terá dificuldade em se deslindar com a habitual impunidade.

Numa estação de correios desta Região não uma ou duas cartas desapareceram, mas centenas! Desaparecimento que teve o tratamento que é habitual: encolher os ombros. Não estavam registadas, paciência. Ainda por cima os caminhos andam cheios de buracos.

Acontece, no entanto, que o «milagre» aconteceu: as cartas apareceram. Mas não por via de qualquer diligência dos CTT, apenas porque um cidadão comum as descobriu enterradas na terra e as foi entregar a um dos seus remetentes!... Assim mesmo, enterradinhas da costa. Cartas, mesmo sujas e tudo, que os CTT andam, finalmente, a entregar aos destinatários.

Naturalmente que haverá um responsável directo por esta situação mas não se trata de crucificar ninguém ou procurar bode expiatório para as deficiências desta verdadeira calamidade regional.

Importa, sim, pegar num caso exemplar e extremo como este e perguntar a quem de direito como é que é possível que situações destas acontecem em 1992. Como é possível que actuações desta gravidade possam existir e passar despercebidas e impunes, não fora uma coincidência?

Se calhar, grande parte dos nossos sofrimentos são devidamente a papeis que se enterram ou deitam fora, funcionários que não arranjam os equipamentos, responsáveis que não fiscalizam adequadamente os seus serviços, etc..

Quem faz um cesto, faz um cento.

P E D R O  D A M A S C E N O



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