FACE
OCULTA
«A natureza conduz-se, não se muda»
Voltaire
O AMBIENTE E A POBREZA DE “ESPÍRITO”
Admitindo como premissas iniciais as
bolsas de pobreza que existem em Portugal e os ainda medíocres níveis de vida
de grandes sectores da população portuguesa, não deixa de ser igualmente
verdade que a pobreza de muita gente tem mais de atávico e cultural do que
real.
É comum ouvir-se a evocação de que
«sou pobre» ou «somos pobres» como explicação para deficiências, incapacidades,
demissões, etc. Sem que, em muitos casos, haja qualquer correlação visível ou
sequer exista pobreza pecuniária real.
A pobreza é, de resto, um conceito
lato que vai desde penúria e estreiteza de posses até à mansidão e escassez de
inteligência. Assim é a língua portuguesa, rica e traiçoeira.
Vem tudo a propósito do ambiente e
da sua prevenção.
Um pouco como em outros sectores, o
público, em geral, tem em relação aos problemas do ambiente uma atitude
passiva, esperando do governo e das autarquias as soluções de todos os problemas.
E se é bem certo que os grandes
problemas do ambiente implicam, pela sua dimensão, complexidade e custos, a
intervenção do Estado; não é menos certo que muito pode ser feito pelos
cidadãos, quer a título individual quer comunitário
O tratamento dos grandes lixos, quer
industriais quer caseiros, são, por exemplo tipicamente tarefa de entidades
públicas. No entanto, actos tão triviais como não cuspir na rua e não deitar
lixo de qualquer maneira e em qualquer lado, são tipicamente tarefas de todos
nós.
E, contudo, esses «pequenos» actos,
aparentemente banais e sem grande significado, multiplicados por milhares ou
milhões, constituem um impacto ambiental de grande gravidade.
Da mesma forma, se a defesa do
grande património e as actividades legislativas de preservação do ambiente são
da competência do Estado, há inúmeras maneiros do cidadão comum participar
nessa grande tarefa que é a manutenção e enriquecimento da natureza, primeira
condição para a qualidade da vida humana. Não poderá haver vida humana de real
qualidade se modificarmos de modo severo a natureza que é o habitat
imprescindível para que o homem não se divorcie da sua real identidade: animal,
racional e evoluído (?), mas indiscutivelmente animal com necessidades
fisiológicas ineludíveis.
Para construir um mamarracho ou
poluir não é essencial o grau de riqueza ou pobreza do autor. Um «pobre» não
tem necessariamente que ter uma habitação feia, austera e triste. Da mesma
forma que um «rico» não tem necessariamente que ter uma habitação bonita, bem
integrada e alegre.
Postos de lado os casos de
marginalidade e de real pobreza, tudo passa mais pela alma do que pelo bolso.
Uma habitação, bem modesta, pode ser
acolhedora, alegre e integrada na natureza. Como também uma habitação, bem
luxuosa, pode ser uma agressão ao ambiente, feia e triste. Tudo irá depender,
essencialmente, de quem lá vive.
Mais tarde ou mais cedo, o homem
terá que concluir que a sua corrida vertiginosa para o consumismo e alienação
material é suicida. Os níveis de conforto material terão que atingir, bem cedo,
um patamar máximo sob pena de se continuar a depredar, de forma irreversível, o
planeta de cuja sobrevivência inteiramente dependemos. Bastará imaginar os
biliões de habitantes do chamado terceiro mundo animados do mesmo espírito de
competição desenfreado de uma América ou de um Japão. Pura e simplesmente não
haverá Terra que resista.
O homem terá necessariamente de se
virar para dentro, para a sua vida interior. Terá que haver um limite para o
número de futilidades e bens de consumo totalmente supérfluos. A «competição»
terá de se centrar mais no miolo e menos na casca.
O problema do ambiente passa muito
mais pela nossa riqueza espiritual do que pela nossa pobreza material.
Antes dez poetas pobres do que cem
«pobres» ricos.
P E D R O D A M A S C E
N O
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