FACE
OCULTA
Fascismo não é um partido político mas um conceito de vida e
uma atitude em relação ao homem, ao amor e ao trabalho
Wilhem Reich
A ERA DA JUGOSLÁVIA
Independentemente
de qualquer tomada de posição sobre o que se passa ou tem passado na antiga
Jugoslávia, já é lícito considerar que estamos perante uma situação que define
uma época histórica.
Com efeito, a
erupção tão intensa das mais variadas formas de xenofobismo, nacionalismo,
racismo, fundamentalismo e crueldade humana atingiu proporções tais que vai
marcar um lugar na história da evolução da humanidade.
Sobretudo tendo
em atenção que tudo isto se passa no rescaldo do holocausto da 2ª guerra
mundial, período que muita gente tentou imputar, em exclusivo, a Adolf Hitler.
Mas cuja responsabilidade foi colectiva e de uma nação demenciada por valores
que, agora, voltam a surgir na antiga Jugoslávia. Os ingredientes estão todos
lá.
E se, hoje, não
estamos a assistir em directo pela televisão a um novo holocausto é
simplesmente porque as condicionantes exteriores são diferentes e porque a
velocidade da divulgação das notícias, sobretudo das imagens, é vertiginosa.
Mas, salvaguardadas as respectivas proporções, estamos a assistir, diariamente,
a acontecimentos que têm, como pano de fundo, o mesmo total e repugnante
desrespeito pela vida e pela dignidade humanas.
Aquilo que devia
ser a preocupação central de uma comunidade civilizada – os valores da
solidariedade, da justiça e da tolerância – é, precisamente, o que está
esquecido no dia-a-dia de um (ou vários) país situado geograficamente na
Europa! Europa que tanto prezamos como cadinho dos valores mais avançados da
humanidade.
Não estamos a
falar de um populoso e miserável país da Ásia ou de um massacrado e faminto
país da África. Falamos da nossa preciosa Europa, de coisas que acontecem bem
ali ao lado do antigo Império Austro-húngaro e da, agora, celebrada e
civilizada Europa Central.
Quando tudo
parecia caminhar bem melhor a nível mundial, com o término da guerra fria e do
conflito leste-oeste e com o crescimento da consciência ambiental no meio de
avanços tecnológicos e científicos notáveis, eis que somos confrontados com
aquilo que efectivamente nunca deixamos de ser: seres mesquinhos e egoístas
capazes das mais cegas atrocidades.
E essa é, provavelmente,
a maior lição que teremos de tirar dos conflitos da Jugoslávia. Depois desta
longa caminhada que tem sido a evolução da humanidade, temos que concluir que a
qualidade da nossa estrutura de carácter e de comportamento deixa, ainda, muito
a desejar. Seja na Bronx de Nova Iorque, em Pequim ou na Bósnia da Jugoslávia.
Todos os nossos
avanços no campo do conhecimento e da cultura não têm sido suficientes para
evitar que continuemos a ser «insignificantes bichos inteligentes com sujas
necessidades fisiológicas» e com desempenhos muito deficientes a nível de
comportamento e do carácter. E que ninguém se iluda, tentando arranjar bodes
expiatórios para aquilo que hoje acontece na Bósnia, em Angola ou na Somália,
que ontem aconteceu no terceiro reich e que amanhã poderá acontecer noutro lado
qualquer.
As cruzadas, a
inquisição, o nazismo/fascismo e outros mimos do nosso dever colectivo não
estão, ainda, enterrados em termos de representarem épocas do comportamento
humano que hoje já não seriam possíveis. Bem se engana quem pensa assim. Os
sintomas estão por todo o lado: os elevados índices de criminalidade violenta,
a retoma de conflitos armados por todo o lado, o ressurgimento em força dos
skinheads, as teorias super-individualistas de sucesso económico por todos os
meios, etc..
Simplesmente a
Bósnia está junto aos centros nevrálgicos da nossa tão apregoada civilização
ocidental e estamos na alvorada do século 21. O que torna tudo bem mais real e
inquietante. Se fosse lá longe, num país de terceiro mundista qualquer ainda
poderíamos continuar a agasalhar-nos no nosso casulo europeu.
Mas assim, não.
Por isso tudo
talvez seja lícito falar de uma era da Jugoslávia.
P
E D R O D A M A S C E N O
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