FACE
OCULTA
A
lei é como teia de aranha: apanha as moscas mas é incapaz de apanhar os
insectos grandes
Ana Carsis
«NÃO HÁ DINHEIRO» OU DOIS PESOS E DUAS
MEDIDAS?
Com uma frequência cada vez maior,
ouvem-se, nas mais variadas instâncias, queixas de que o governo não paga
porque «não há dinheiro». E de tal modo isso se banalizou que passou, quase, a
ter estatuto de fundamentalismo legítimo e perfeitamente aceitável!
Os mais variados departamentos
oficiais e respectivas repartições não pagam as dívidas que contraíram, não
honram os compromissos que assumiram e, inclusive, não cumprem os objectivos
para que foram criados e para que existem com o mesmo «sacrossanto» e universal
pretexto.
Situação que começa a pôr em causa a
estabilidade financeira de inúmeras empresas e a provocar uma ruptura grave a
nível do investimento privado numa região aonde o tecido empresarial já é de si
mesmo frágil e ainda muito dependente do Estado. E o que, ainda é pior, começa
a criar grandes dificuldades a nível da prestação adequada de serviços em
sectores cruciais como são a saúde e a educação.
É evidente que qualquer cidadão
responsável e sensato, percebe que o Estado não está a cima de vicissitudes que
lhe são estranhas como conjunturas internacionais ou nacionais difíceis,
catástrofes naturais, etc.. Mas ninguém, por mais sensato e moderado que seja,
pode perceber é como que é que o estado, vértice da sociedade democrática e seu
espelho natural, assuma, com a maior lata, posturas perfeitamente caloteiras e,
ainda por cima, o faça com total impunidade.
Mas para que servem, então, os
tribunais de contas, os procuradores gerais da republica, os provedores de
justiça e outros tantos ditos defensores e fiscais do estado de direito?
Porque afinal de contas os credores
do estado, e falar em estado devia falar em todos nós, não têm outro remédio
que não seja calar e esperar porque depender dos tribunais é a mesma coisa que
aguardar um D. Sebastião trajado de beca. E protestar não adianta porque não há
memória de caloteiro ter vergonha!
A última desculpa a utilizar pelo
estado para não cumprir devia ser mesma esta. Porque se não tem dinheiro que o
vá pedir emprestado como fazem todas as pessoas de bem que têm dívidas. Ninguém
tem culpa, para além dos políticos, que o estado viva acima das suas
possibilidades e não saiba planear e programar adequadamente.
O estado devia ser, exactamente, o
primeiro a dar o exemplo em matéria de pagamentos, compromissos e planeamento.
Pode ser conduzido, pelo menos teoricamente, pela nata dos cidadãos e por
representar, face à constituição, não só a face da nação mas por ser
responsável, em primeira linha, pelo cumprimento da lei.
Um estado de direito é,
precisamente, um estado em que nenhum cidadão ou instituição está acima da lei.
Um estado que se rege por normas universais e democraticamente assumidas.
Imprevistos acontecem, mas isso é
verdade para toda a gente.
Quando a carne ou o leite não é pago
aos agricultores, estes não podem empregar a desculpa (ainda que a verdadeira)
que não tem dinheiro para pagar os seus compromissos, sejam eles bancários,
fiscais ou privados. Se eu tiver uma série de grandes imprevistos pessoais ou
familiares, de doenças ou de dívidas de outrem, o estado não vai esperar para
eu ter dinheiro para pagar os impostos, a caixa de previdência e por aí fora.
Fica, portanto, que o estado é a
única entidade que pode ferrar o calote à vontade, sem se preocupar com juros
de mora ou responsabilidades penais. Basta-lhe só utilizar a fórmula mágica
«não há dinheiro» e fica tudo explicado e nos conformes.
O cidadão comum, esse terá de se
conformar com a dura realidade que tem que cumprir a lei.
Ou se trata de dois pesos e duas
medidas?
P
E D R O D A M A S C E N O
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