FACE
OCULTA
«Cai mais mal a
um ministro dizer asneiras do que fazê-las»
Cardeal de Retz
O BORREGO EXPIATÓRIO
Dada a circunstância
institucionalizada de que ataques exteriores a um ministro, quer por parte da
oposição quer da comunicação social, é passaporte seguro para ficar de pedra e
cal no governo, surpreendeu o despedimento fulminante do ministro do Ambiente.
Não estão, obviamente, em causa o
mau gosto e o despropósito de uma anedota que virou notícia de primeira página.
O episódio foi grotesco e inadequado, mas não passou de uma gaffe.
Agora que una questão de
lana-caprina como esta tenha conduzido a uma demissão em tempo recorde de um
ministro de Cavaco foi, efectivamente, uma surpresa considerável. Sobretudo
tendo em atenção que há semanas/meses se desenrola o folhetim da água de Évora
que atinge em cheio a credibilidade do sistema de saúde em Portugal.
A anedota de borrego não passou de
uma anedota e ninguém morreu por causa disso. Agora, a ineficiência e incompetência
que se desenrolou no Hospital de Évora matou gente. E este facto que representa
ou que devia representar a máxima falência de um sistema de saúde – a morte –
não conduziu a nada que se aproxime do rigor com que foi tratado o coitado do
borrego que, naturalmente, será daquelas pessoas sem graça e que nem sequer tem
jeito para contar anedotas sem sentido das conveniências.
Pecados bem menores do que ser
responsável por um sector tão importante e delicado como é o da saúde e não ser
capaz de, com transparência e rapidez, fazer justiça e, sobretudo, repor,
dentro do possível, compensações às famílias atingidas.
São níveis de responsabilidade bem
diferentes, um responsável governamental contar uma anedota de humor negro em
público ou gerir de ~modo completamente inadequado uma situação de desleixo, incompetência
e irresponsabilidade que ceifou vidas humanas.
Contudo a nível das punições
passou-se exactamente o contrário. Enquanto que o jogral frustrado levou um
pontapé no fundo das costas, o ministro da crise continua no seu lugar,
impávido e sereno.
Donde se poderá concluir, com uma
lógica dificilmente refutável, que o que conta são as aparências e não a
essência. Ficou mal o ministro contar, em público, uma anedota por muito tola
que tenha sido, mas não fica mal que o ministro responsável por um sector
essencial que claudicou e claudica de forma tão notória e trágica continue em
funções.
Ou, como dizia há dias uma pessoa
amiga, se calhar o que safou o Natalino é que não se lembrou de contar alguma
anedota tola. Porque às tantas, se o tivesse feito, Já estaria no olho da rua!
De modo que terá que passar a fazer
parte da cartilha dos ministros cavaquistas o mandamento crucial de não contar
anedotas sobre a actuação dos colegas.
Ou então a anedota foi só o jeitinho
que o primeiro-ministro arranjou para dar o fora a um colaborador que queria
despachar. Matando, deste modo, dois coelhos de uma só cajadada: livra-se do
indesejado e dá uma de moralista em tempo de crise.
Se calhar foi por isso que perdemos
um borrego expiatório e mantivemos um Alumínio de Carvalho.
P
E D R O D A M A S C E N O
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