FACE OCULTA
«Os que tiveram que
ser presos, sê-lo-ão, calmamente, durante a noite. Possivelmente terei que
executar 100.000 pessoas mas os outros 300 milhões viverão em paz. Eu tenho o
direito de executar 100.000 pessoas. Eu tenho esse direito como presidente»
Vladimir Zhirinovsky
O MUNDO DE ZHIRINOVSKY
O grave da citação, acima
transcrita, é que foi feita em Dezembro de 1993 por um político que acabava de
obter um expressivo resultado eleitoral neste nosso conturbado mundo e num país
que era, até há bem pouco tempo, uma grande potência mundial. Um homem que
afirma que a política é constituída por 70% de mentiras e terror e que, por
consequência, não é possível fazer política sem mentiras e terror!
Tudo não passaria de um lamentável
incidente a juntar a tantos outros se não fosse este fascista puro, o líder da
força que obteve o resultado mais espectacular nas últimas eleições na Rússia. Um
fascista descarado que nem se preocupa em disfarçar o seu racismo e
nacionalismo primários. Um homem arrogante, inculto e agressivo que consegue,
contudo, através de uma demagogia ultranacionalista e racista arrastar as
massas atrás de si. Um homem que apela aos instintos mais primários e negativos
eleitorado e que, quase, consegue chegar ao poder.
Situação que, pela perversão que
representa, abala, fortemente, o próprio conceito de democracia parlamentar
ocidental. Porque sendo este sistema, apesar de tudo, o melhor conhecido, ainda
assim não consegue impedir desvios graves daquilo ao longo de gerações se tem
vindo a constituir como o núcleo cultural e político desse próprio sistema
democrático a permitir e viabilizar o acesso aos poder de forças anti-democráticas?
A democracia para subsistir não pode
chegar a um ponto de debilidade tal que seja, ela própria, a gerar, no sei
seio, a sua causa de morte. Seria como um médico que se estivesse a matar os
seus próprios doentes! São coisas completamente contraditórias nos seus termos
e que portanto não fazem qualquer sentido lógico.
De modo que é perfeitamente legítimo
poder afirmar-se que não existe na Rússia, por muito que isso pese a alguns
idealistas bem intencionados, democracia. Existe apenas um simulacro
carnavalesco e em versão russa de democracia para europeu ver. Haverá quem ache
que apesar de tudo é preferível um Boris Yeltsin e esse simulacro do que o
sistema que lá estava, antes. É possível mas que ninguém se iluda quanto ao
teor perverso do actual sistema que vigora a Rússia.
Mas como se pode compreender e muito
menos aceitar que um homem como Zhirinovsky tenha assento num parlamento dito
democrático quando ele representa tudo aquilo que esse parlamento não pode
significar?
Não será levar a tolerância
democrática longe de mais?
Ou será apenas mais um daqueles
casos em que a nossa hipocrisia civilização vai meter a cabeça debaixo da areia
e fingir que não está a perceber nada? Um fascista e racista assumido não
poderia, nunca, ter lugar, passem os votos que ele teve, num órgão que pretende
ter uma instituição representativa de quem aceita as regras do jogo democrático
e não mero instrumento de poder para quem não respeita e muito menos aceita os
valores essenciais de um estado de direito.
A comunidade internacional estará a
cometer um grande erro político ao tomar uma atitude passiva num caso como
este.
Não se pode analisar o caso russo
com os valores e os olhos de Londres, Paris ou Bona. É uma sociedade que acaba
de sair de uma longa noite de totalitarismo com valores quotidianos e uma
cultura muito diferentes da Europa Central. Tentar transpor para lá, de uma forma
mecanicista, os nossos valores poderá levar a erros grosseiros de avaliação.
A Europa e os estados Unidos terão
que avaliar muito bem os termos e as condições em que fazem e farão a sua
ajuda. A passividade da Europa será, sem dúvida, interpretada por espíritos
como os de Zhirinovsky como prova de fraqueza e de medo da comunidade
internacional. Veja-se o exemplo do Iraque e de Saddam que continuam a
incomodar tudo e todos porque apenas não houve a coragem de assumir até às
últimas consequências a Guerra do Golfo.
Os inimigos da democracia não podem,
em nenhuma circunstância, ser tratados como democratas. Esse erro,
repetidamente cometido, tem levado ao derrame de muito sangue inocente e de
muito sofrimento. Os exemplos são tantos e tão recentes que nem vale a pena
citá-los.
Que haja coragem para alguém se
levantar e gritar bem alto que o rei vai nu.
P E D R O D A M A S C E N O
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