FACE OCULTA
“Cada
vez que um patife não é punido, um homem honesto é troçado”
George Saville
IRONIAS DE JUSTIÇA
Quando há bem pouco tempo, um pacato
cidadão britânico, em fase terminal de uma doença maligna, foi preso por se ter
insurgido contra uma sentença injusta, era dada mais uma prova pública da farsa
em que a justiça ocidental tantas vezes se transforma.
A história é simples: um jovem
londrino é atacado por um grupo de marginais e é espancado quase até à morte.
Dois dos autores do assalto são presos e julgados e o resultado final é a
libertação com uma pena levíssima de prestação de serviços cívicos (?).
Indignado o pai da vítima insurge-se em pleno tribunal, dirigindo algumas
palavras duras ao juiz (provavelmente as mesmas que qualquer pai normal e
corajoso dirigiria face a um tal disparate). O juiz exige desculpas que o pai
não dá e este é imediato condenado a pena de prisão efectiva e encarcerado
apesar do seu estado de saúde muito frágil.
Conclusão inevitável: é mais grave,
em Inglaterra, insultar um juiz – mesmo com razão – do que agredir muito
gravemente um cidadão. E falamos do país europeu com mais antigo curriculum
democrático e com um sistema judicial com muitos pergaminhos.
Como pode, então, uma perversão tão evidente?
Pelo simples mas preocupante facto de que a justiça do nosso mundo ocidental se
ter tornado num intricado mundo de burocracia em que tudo joga a favor do
delinquente habitual e contra o pacato cidadão comum que tenha a pouca sorte de
eventualmente meter “o pé na poça”. O complexo mundo judiciário tornou-se um
terreno extremamente favorável ao mundo do crime e aos delinquentes habituais
que sabem, como ninguém, tirar partido das deficiências do sistema e mesmo dos
direitos e liberdades constitucionais que existem com a preocupação essencial
de defender cidadão comum mas que tantas vezes permitem lacunas legais e
expedientes de todas a ordem que são aproveitadas por quem não tem escrúpulos
de qualquer ordem.
O sistema na sua preocupação
meritória de defender os direitos, liberdades e garantias criou um figurino de
justiça que, no dia-a-dia, se mostra incapaz de assegurar aquilo que deveria
ser a sua essência: a punição rápida e eficaz dos prevaricadores e a defesa
real da segurança e bem-estar do cidadão comum. O sistema persiste em tratar
com paninhos quentes e com cortesia quem deliberadamente e de forma sistemática
o utiliza para a prática impune de crimes.
E de tal modo isto se tornou um dos
aspectos da nossa vida que já ninguém acredita, a sério, na justiça. Ninguém acredita
nem na política nem na justiça. Toda a gente sente, de forma mais ou menos
evidente, que o cidadão normal e cumpridor tem a maior dificuldade em fazer
valer, sem sede de tribunal, os seus direitos – levar-lhe-á anos a fio e quando
a justiça chega (se chega) vem tarde e a más horas não servindo já para nada.
Em contrapartida toda a gente sente que o prevaricador “espertinho” acaba
sempre por se safar porque joga com as debilidades do sistema e com direitos
que foram assegurados a pensar nos cidadãos honestos e bem intencionados.
A justiça para cumprir os seus fins
tem de ter duas componentes essenciais: ser rápida e eficaz. O patife tem de
sentir na pele, de forma rápida, uma punição que lhe dê claramente a noção de
que o crime não compensou.
Os armazéns de presos em que se
transformaram as nossas cidades são um peso morto nas nossas sociedades com
enormes encargos para a comunidade e constituem, geralmente, verdadeiros
viveiros de criminosos graves que pululam à sombra do ócio. Não pode ser a
sociedade a pagar o castigo aos que prevaricaram. São eles próprios que terão
de assegurar o pagamento do sistema de punições que lhe é infligido
Uma sociedade civilizada tem que
saber defender os direitos e liberdades dos seus cidadão mas também tem que
saber garantir a sua segurança de forma eficaz e assegurar que o lobo vestido
na pele de cordeiro não seja confundido com este. Deve ser aberta e tolerante
para com o cidadão comum que cumpre de forma habitual e regular os seus deveres
(mesmo prevaricando aqui e ali em coisas menores) mas firme e intransigente
para o delinquente habitual e grave.
As sociedades modernas têm que
perder de forma rápida alguns complexos e actuar de forma eficaz sob pena de se
transformarem em sítios aonde não é possível viver com um mínimo de qualidade
de vida. Democracia nunca deve ser sinónimo de fraqueza: tolerância sim,
debilidade nunca. O primado das liberdades individuais não pode ser levado ao
extremo de se transformar no parteiro da opressão das liberdades colectivas.
O estado de direito para ganhar
credibilidade rem que assegurar um sistema judicial que a generalidade dos
cidadãos respeite e a quem reconheça um papel crucial na defesa da sua
liberdade e qualidade de vida e que seja visto e sentido pelos criminosos como
um obstáculo temível às suas actividades.
Só assim se poderão separar as águas
e garantir sociedades aonde valha a pena ser cumpridor e honesto.
P E D R O
D A M A S C E N O
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