sexta-feira, outubro 13, 1995

Cvaco por um canudo?

FACE OCULTA


CAVACO POR UM CANUDO?


Extintos os últimos clamores das legislativas, que tiveram um desfecho exemplarmente claro, já se começam a aquece os motores para as presidenciais.

E é assim que vem um PSD, ainda a camber as feridas da derrota eleitoral, solicitar, nalguns casos pateticamente a candidatura presidencial de Cavaco Silva. Em termos e com veemência que chama a atenção de qualquer observador menos atento.

E os termos são efectivamente muito peculiares: o ex-partido maioritário, protagonista quase único da vida política nacional dos últimos dez anos, vem no rescaldo da derrota propôs o seu líder e ainda primeiro-ministro como defensor ideal do equilíbrio das instituições e árbitro privilegiado!

Ou seja, o homem que marcou o estilo e o conteúdo da governação de Portugal durante uma década e que foi, por isso mesmo, o principal responsável pela derrota do seu partido (Fernando Nogueira apenas desempenhou o papel de duplo: levou a porrada que era para o outro) seria, na óptica do PSD, o político ideal para garantir, agora, a estabilidade da vida política nacional que passou a ter como protagonista principal exactamente o partido que lhe infligiu essa derrota!

Situação que torna o apelo de altos dirigentes social-democratas à candidatura do Prof. Cavaco Silva em puro surrealismo político. Surrealismo que só pode encontrar explicação na ansiedade que esses dirigentes colocam na procura de um salvar de face para um partido que, de repente, passou do tudo para um papel secundário. Possivelmente o próprio PP poderá vir a ter um papel mais relevante na nova legislatura.

Independentemente dos méritos (e tem muitos) e deméritos que o Prof. Cavaco tenha, ele é, talvez, o político menos bem habilitado – neste momento – para assegurar a estabilidade que, efectivamente, Portugal necessita nos próximos quatro anos. Pela circunstância muito simples mas fatal de terem sido ele e as suas políticas os grandes derrotados das eleições legislativas.

O eventual sucesso do Governo do Partido Socialista será, sempre, a confirmação da justeza da derrota do Partido Social Democrata e de Cavaco Silva. Apenas um mau governo e uma má governação do PS serve, objectivamente, os interesses dos derrotados.

O que torna o ainda primeiro-ministro em parte altamente interessada num desfecho dos próximos anos de governo socialista e, consequentemente, falho da isenção indispensável ao exercício do cargo de presidente da república. O único objectivo que a sua eleição poderia servir seria, apenas um salvar de face para um partido e para um homem que já não estavam habitados a perder.

Quando Cavaco Silva abandonou a liderança do partido da forma como fez, sabia muito bem o que estava a fazer. Quando manteve um silêncio tumular sobre a sua candidatura a Belém, também sabia muito bem e que estava a fazer. Deixou um partido e um país suspenso de desígnios cujos contornos possivelmente só ele próprio conhece e que são, por isso mesmo, essencialmente individuais.

Se Cavaco Silva não se candidatar às próximas eleições presidenciais vai deixar, certamente, em pânico largos sectores do seu partido mas ficará posicionado para o poder vir a fazer em circunstâncias mais favoráveis no futuro. Se o fizer agora, apenas virá provar que a sua saída da liderança do partido não foi um acto de desapego ao poder mas somente uma maneira habilidosa de fugir com “o rabo à seringa” de uma derrota humilhante que ele temia para logo a seguir tentar apanhar o primeiro comboio de poder. Circunstância que lhe poderá valer outra valente derrota e ao PSD.

Poderá argumentar-se, com o mesmo tipo de lógica, que a candidatura de Jorge Sampaio está também inquinada de falha de isenção tendo em conta a actual maioria socialista. Embora as circunstâncias sejam, substancialmente, diferentes (a candidatura surgiu bastante antes das legislativas), essa possibilidade existe e será, com certeza, juntamente com o perfil dos restantes candidatos, uma das várias questões que deverão vir a pesar na decisão final dos eleitores.

Mas uma coisa é certa: Cavaco Silva é, neste momento, o político que menos condições subjectivas e objectivas tem para assegurar a estabilidade em Portugal – tudo está demasiado próximo e quente para que ele possa assegurar as indispensáveis qualidades de serenidade e isenção para o exercício da mais alta magistratura do estado.

Cenário que poderá se bem diferente daqui a cinco anos.


P E D R O  DA M A S C E N O



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