sexta-feira, setembro 26, 2008

SER AÇORIANO

Que bom é ser açoriano
Carlos Cesar




SER AÇORIANO


A frase “que bom é ser açoriano”- embora slogan político - só nos pode fazer bem à alma. Sobretudo depois de um povoamento que foi tão difícil e doloroso. Um passado duro bem atestado por tantas paredes de pedra e maroiços.

Mas como diz Dias de Melo: Já quando os homens chegaram pela primeira vez à Ilha, a encontraram rasa de pedra, que fora fogo vomitado pelos vulcões:pedras colossais, amontoadas a esmo,[...] - mas combatento, braços entesados e mãos crispadas, a grande batalha contra as pedras negras da Ilha.Estarraçaram, escavaram, removeram, abriram caminho - e a terra começou a surgir!

Ser açoriano é, antes de tudo, ser herdeiro dessa saga de suor e sangue. Desse batalhar de sol a sol e de tantos anos de esquecimento e abandono, apenas amenizados pelos dias esparsos de São Navio.

Ser açoriano é ser filho desse casamento entre as terras de lava e o mar. Amamentado por um céu infinito e por ares pouco navegados e criado num berço verde, espesso e a perder de vista.

É poder estar sentado, num dia soalheiro, a olhar do Pico para o Faial, com os ilhéus em frente. Ouvir o suave barulho das ondas de um mar calmo que vem brincar com as rochas e nos devolve a paz de um mundo que ainda não está perdido.

É ser capaz de partilhar, em pleno, com os socalcos que vão por aí acima até à montanha (sobranceira e distante) a energia que imana desse testemunho da força do ventre que lhe deu origem.

Ser açoriano é saber amar a natureza, a tranquilidade e pureza do ar e do mar. É saber sentir esse privégio único que é estar (quase) a salvo desse vale de lágrimas em que grandes zonas do nosso planeta se estão a transformar.


É perceber e sentir que o que foi o nosso calcanhar de Aquiles – a distância e o isolamento – se transformou num ganho. O que é ampliado por não termos, felizmente, auto-estradas de três ou quatro pistas que aqui desemboquem e nos tragam mais carros e garrafões.

E interiorizar, portanto, que o essencial é conseguirmos preservar aquilo que veio – via adversidade – a transformar-se num património invejável: a natureza, a tranquilidade, a segurança e a paz. Bens que, hoje no mercado mundial, ultrapassam – de longe – o valor do barril de petróleo.

Não tendo óleo, temos o melhor óleo do mundo.

“Óleo”que, essencialmente, vale por não ser “extraído”. Sendo o desenvolvimento indispensável e desejável é necessário que não mexa com aquilo que é a essência dos Açores: a ruralidade e casamento, para a vida e para morte, com a natureza.

Ser açoriano é perceber bem isso e não ceder às tentações do consumismo desenfreado e ao dourado plastificado do betão. É sim melhorar o conforto, a segurança e a qualidade de vida sem pôr em causa a matriz que nos identifica e nos faz sentir no topo do mundo.

“Que bom que é ser açoriano” é, por isso, um empolgante desafio que deverá ir muito para lá da acção política para se transformar num bom dia de todos nós quando perdermos a vista no horizonte longínquo do nosso mar azul sem fim.



P E D R O D A M A S C E N O

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