F A C E O C U L T A
O fim da arte
inferior é agradar, o fim da arte média é elevar, o fim da arte superior é
libertar.
Fernando Pessoa
Cultura, Títulos e Rock'n'rol
Portugal, sobretudo depois da
expulsão dos judeus e da perseguição aos jesuítas, nunca primou pelas suas
elites culturais. E o que delas restava foi “primorosamente” espezinhado pelo
Estado Novo.
Ficaram uns quantos resistentes que
acabaram levados pela enxurrada da “cultura de massas” e de quem se vêm, por
vezes, alguns afloramentos. Mas que, geralmente, acabam perdidos num mar de
lugares comuns e mediocridade.
As recentes polémicas sobre títulos académicos “turbojet” nada mais são do
que a outra face da mesma moeda. Mesmo um cursinho tirado de fio-a-pavio não dá
qualquer garantia, nem de qualidade técnica nem de valia cultural.
A inflação de “drs” em Portugal está associada à baixa de qualidade do
ensino universitário e à proliferação de universidades e cursos. Tendo a
louvável e progressista iniciativa de democratizar o ensino e dar iguais
oportunidades a todos, aberto as portas a negócios de quase vão de escada.
Só assim se percebe a confrangedora mediocridade de fornadas de licenciados
que, em muitos casos, mal sabem falar e escrever. Situação bem mais grave
daquela em que ocasionais chico-espertos souberam aproveitar as debilidades do
sistema e que, em alguns casos, estão mais preparados que os licenciados de
carreira.
A universidade devia ser, antes de mais, uma escola para gerar gente de
bitola intelectual e cultural superior, susceptível de acompanhar, pela vida
fora, o ritmo alucinante do conhecimento e dos progressos técnicos. Talvez por
isso mesmo ainda se chame ensino superior.
Não de drs para pôr em cheque ou em cartão-de-visita. Não de gente que foi
convencida que o que era importante era ter um canudo e para quem essa palavra
estranha - resiliência - era evitável com o recurso a um atalho proporcionado
por uma universidade privada.
E com a enxurrada da cultura de massas vieram os Códigos da Vinci e agora o
fenómeno Grey com as “As cinquenta Sombras de Grey”, livros para ler na praia e
que constituem exemplos inquestionáveis da cultura instalada.
Bem pode o pobre José Luís Peixoto matar-se a escrever “Abraço’s” e outros
livros que tais em que pondera o tempo, a reflexão e a sabedoria e em que a
lucidez se torna milagre. Nunca poderá destronar uma porno-xaxada mal escrita
mas que activa as feromonas das donas de casa.
Cultura e universidade deveriam andar, de mãos juntas. Não cultura no
sentido bafiento e chato do salazarismo mas cultura no sentido mais
universalista e polivalente e que as actuais facilidades digitais e da net
permitem.
Tempo da música continuar a ser música sem perder, contudo, a
contemporaneidade e a modernidade e da arte pode vingar sem se tornar no
bezerro de plástico de qualquer governo mas antes modelando o talento aos novos
desafios da vida e às grandes questões do tempo presente.
Estamos na época em que a cultura e arte abriram mão do seu papel de intérpretes
e fieis depositários das nossas inquietações e da nossa sabedoria para se
tornarem em produtos de prateleira de supermercado, ao lado dos detergentes e
do papel higiénico.
Não admira, pois, que o ensino e os canudos andem pelas ruas da amargura.
Entraram em saldo e de lá não sairão enquanto a inaptocracia (o sistema dos inaptos) continuar a ganhar raízes e arremedar-se
de regime democrático e não prevalecerem os princípios do mérito e da
competência.
P E D R O D A M A S C E N O
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